Thursday, August 31, 2006

 

ADENDA A M&M

-Isso é impossível, embora, atrás tivesses baralhado os dados. O que me parece ser uma grande sacanice.
-Ainda bem que colocas em questão as tuas próprias respostas. Eu penso que o cérebro como substância material não pode produzir senão substância material.
-O pensamento, substância material?
-Ou um derivado de substância material.
-Se é matéria, o pensamento até pode ser aquecido. Ah! Ah! Ah! Isto está mesmo bom!
-Penso que fui claro sobre este assunto, nos vários “Cadernos do Olhar”.
-Não li. No entanto, se o pensamento é substância material deve poder ser transportado de um lado para o outro?
-Que p pensamento apresenta mobilidade não tenho dúvidas. Já é antiga a referência da corrente de consciência de W.J. Quem o transporta? Não sei! Eu nunca tal vi. Porém, os cientistas têm uma versão baseada na química cerebral muito aceitável. Antes de chegarmos a este ponto temos de entender discursivamente quais as características do pensamento. A nós basta inferi-lo do jogo intelectual. É uma espécie de deleite.
-Não há segundas intenções?
-E se as houver, qual é o problema?
-Era como se estivesse condicionado a uma esterilidade.
-Não concordo. O que descobrimos até faz sentido. O cérebro não tem capacidade de criar algo que seja imaterial. Porque se o fizesse seria o criador. O criador divino! Só a este cabe a criação da imaterialidade. Imaterialidade criada pela matéria? Agora cabe-me proferir a palavra mistério. E como esta não está no meu vocabulário, só me resta dizer que o pensamento não existe ou é uma matéria. E como tal tem de ser observada e creditada. Estou preso à materialidade da questão. Sou escravo de uma razão material que não me larga. Que lesão cerebral fui sujeito para ficar impedido de ver a espiritualidade da coisa?
-Influências de “O Erro de Descartes”? Do cognitivo incapacitado?
-É uma boa teoria. É preciso ler António Damásio. Ajuda muito a conhecer a problemática aqui discutida. É a visão da Ciência.
-O Mundo é uma ilusão e a Ciência ajuda-a a ser compreendida.
-Fiquemos por aqui. Ainda estamos no ano 2002...

Wednesday, August 30, 2006

 

CONTINUAÇÃO DE

M&M

MANDALA
Essa é uma questão fundamental em que uma resposta por mais elaborada que seja não consegue satisfazer completamente.
VARETT
Eu creio, tal como tu, que o teu sistema orgânico em que te embrulhaste está deveras programado. Programado com objectivos definidos que tu não sabes quais, como afirmas atrás. É que se tudo é matéria, o pensamento de Deus é matéria também. E digo isto porque para ti tudo é matéria e o pensamento de Deus é dela proveniente.
MANDALA
Ao pensamento é-lhe dada a liberdade de voar de abstracção em abstracção.
VARETT
Não afirmaste que a abstracção pensada é matéria? Como é que essa matéria dá origem à abstracção-matéria-divina?
MANDALA
Eu só acredito na matéria...
VARETT
Se Deus surge para ti como matéria, pois afirmaste que o pensado é um derivado da matéria ou matéria ainda desconhecida, como podes acreditar na matéria e só nela e não acreditares no Deus que acabas por materializar no pensamento que dizes ser matéria?
MANDALA
Deus não surge como matéria. Cuidado! O pensamento de Deus (que é matéria para mim) não é o Deus. Estás a confundir.
VARETT
A ideia de Deus que é matéria, segundo a tua teoria, como é que é materializada e concebida?
MANDALA
A ideia de Deus é para mim um facto materializado. Já expliquei isso! Só que essa matéria, embora por mim detectada dedutivamente, passe a imodéstia (ri-se) é ainda desconhecida dos meios científicos.
VARETT
Ficámos como começámos este diálogo: na mesma!
MANDALA
E por que não?
VARETT
Antes de encerrarmos este diálogo, gostaria que me explicasses como é que de dentro dessa matéria toda surge o sentimento paternal, filial, etc.? Uma matéria a sentir amor por outra matéria. Agora é que me vou rir...
MANDALA
Hoje, estás disposto a quebrar a minha paciência. Na própria evolução da matéria aconteceu que os primeiros animais, muito próximos da matéria e por mais matéria transformada que tivessem sido, tinham pelas crias um grande cuidado para as manterem com vida. Até davam a vida por elas. Traduzindo esse comportamento numa linguagem antropomórfica nada repugna classificá-o de amor paternal.
VARETT
Eu questionava a amor paternal das pedras pelas pedras! Oh, meu Deus!
MANDALA
Se te ficas apenas pelas pedras e não consegues olhar a natureza como um constante mudar, ainda inexplicável, não darás o salto. Se eu te disser que as primeiras espigas de trigo apenas possuíam sete grãos e depois sem qualquer intervenção humana aumentaram a quantidade de grãos que vieram substancialmente beneficiar alguns animais, tu hás-de convir que algo se passa e é considerado muito querido, utilizando a linguagem humana. Até as plantas defendem os seus frutos! Isso é traduzível por amor de “pais para filhos”. As rochas nem sempre foram rochas. Não tens visto a lama incandescente tornar-se em rocha firme, e depois de recoberta de terra lá está ela a permitir criar a vida e assim por diante?
VARETT
E terra arável transformar-se em deserto. Isso não é amor, isso é ódio! Ah! Ah! Ah!
MANDALA
Termino este diálogo satisfeito. Tu próprio já sentes o que sente a natureza...
OUTUBRO DE 2002
ADENDA
Acrescento este texto que encontrei dentro de um cesto de papéis. Penso que antecede este M&M, pois não me lembro da data.

Resumindo. O cérebro que produz o pensamento é matéria. O pensamento produzido pelo cérebro - que afirmámos ser matéria – não é matéria. Posso dizer que o pensamento é imaterial. Posso dizer que é incorpóreo, espiritual e sobrenatural?
-Não tem corpo, sim! É um conjunto de ideias, logo fruto do espírito. Agora, sobrenatural, acho que não.
-Quando o Deus judaico-cristão comunica com os seus eleitos, esse modo de comunicar é uma forma de pensamento?
-Sim, pensamento divino!
-Haverá pensamento divino e pensamento humano?
-Claro!
-O pensamento é, portanto, comum aos dois?
-Claro!
-O pensamento do homem que vai em direcção a Deus é o pensamento humanizado. O pensamento que vai de Deus até ao homem é o pensamento divino. Será?
-Claro!
-O pensamento que parte do homem para o Deus não será um pensamento sobrenatural?
-Quando recebe retorno.
Então o pensamento humano pode, neste caso, ser considerado sobrenatural?
-Claro!
-Este pensamento especial e sobrenatural que vai do homem para Deus é produzido pelo cérebro ou não?
-Claro que é!
-Vamos ver se entendi bem, senão corrige-me. O cérebro humano produz pensamento sobrenatural, logo espiritual, logo imaterial?
-Sim, é uma afirmação.
-Diz-me uma coisa, não é só da competência de Deus a criação do imaterial?
-Sim!
-Mas, pelo que dissemos, o homem também pode criar o imaterial...
-Isso é diferente, porque Deus...
-Já sei, Deus é Deus! Agora, responde-me ao seguinte: será possível uma coisa material, como por exemplo o cérebro, produzir coisa espiritual?
Continua amanhã, dia 31 de Agosto de 2006

Monday, August 28, 2006

 

M & M
Continuação do dia 28 de Agosto de 2006

MANDALA
Deixa de brincadeiras, pois quero dormir a sesta. Responde, por favor.
VARETT
Assustar-me-ia imenso. A emoção seria enorme.
MANDALA
Claro! E se fores ao cinema e observares um drama do tipo familiar, também é possível que te emociones?
VARETT
Claro!
MANDALA
Existem várias graduações de emoções. Até, por vezes, há quem as confunda com as motivações. Para sermos práticos e não estarmos a copiar nos dicionários de psicologia, ou outros, pergunto-te se achas que as emoções são estados que mexem connosco?
VARETT
Pode ser.
MANDALA
Imagina-te agora a picares um caracol com um alfinete. Que é que vês?
VARETT
Ele encolhia-se todo, como estivesse a sofrer de uma cólica renal. Isso não é emoção!
MANDALA
Porquê, agora já falas a linguagem do caracol?
VARETT
O caracol não tem emoções!
MANDALA
Bem, esse tipo de pensamento pertence ao passado e nos dias de hoje há ainda quem não consiga desligar-se de preconceitos medievais. Se calhar, o caracol, depois de o teres picado, encolher-se-ia com cócegas... Imagina uma leoa a dar-te uma patada nas bolas. Não obterias uma sensação nova?
VARETT
Uma sensação primária, ligada à preservação da vida.
MANDALA
Penso que o caracol também sentiu o mesmo quando picado. Imaginemos que tu apanhas um pouco de barro e o colocas numa tina com água. Que achas que acontecerá?
VARETT
O barro desfazer-se-ia.
MANDALA
E se deixares a mistura ao sol?
VARETT
A água evapora-se e fica o barro.
MANDALA
Por que razão o barro não se evapora?
VARETT
Porque é mais resistente e consistente.
MANDALA
O barro não se evapora nem as pedras da calçada ou outros porque estão destinados a isso. Não achas?
VARETT
Sim. Parece-me que tudo tem um destino próprio. O barro quando muito seco transforma-se em pó. E lá se vai a tua teoria.
MANDALA
Penso que não. Esse pó vai organizar-se num outro local e vai obedecer a um novo programa.
VARETT
Vamos esclarecer o teu ponto de vista. Ainda não disseste como nasce nesse mundo só de matéria as emoções.
MANDALA
Eu estava a tentar fazer com que tu percebesses que tudo o que existe é fruto da evolução da matéria. E que a matéria também tem procedimentos que se assemelham aos dos animais, incluindo o próprio homem.
VARETT
Essa não lembraria ao Diabo mais velho!
MANDALA
Diz-me cá uma coisa! Se quiseres cultivar uma planta num vaso, como procederias?
VARETT
Arranjo um pouco de terra. Meto-a no vaso e coloco a planta ou a semente desta dentro daquele e vou regando com água até ver no que dá.
MANDALA
Não estarás a a copiar a natureza?
VARETT
Como assim?
MANDALA
Como é que achas que as plantas crescem na natureza? Não é com terra e água? Tu o que fizeste foi copiar a natureza. Não será?
VARETT
Talvez!
MANDALA
Se analisares a matéria de que és feito vais observar que a natureza também a possui. Tu és irmão da natureza em todos os sentidos. Não te esqueças que o teu Deus te fez do barro e o barro é a terra. É a natureza.
VARETT
Já cá faltava a religião! De qualquer maneira, já que a referiste, justifica-me nesse mundo da matéria e de materiais somente, como é que surge o pensamento de Deus? Esta é muito boa, não achas?

Continua amanhã, dia 29 de Agosto de 2006

Sunday, August 27, 2006

 

M & M

DIÁLOGO DE APOIO
(A QUÊ? - NÃO SEI!)

VARETT
Será o pensamento constituído por água, ar, terra ou fogo? Esta questão vem na linha dos disparates que andas a inventar.
MANDALA
Nos dias de hoje, é difícil definir matéria. Para além destes elementos, haverá, certamente, outro tipo de matéria ainda desconhecida pelos humanos. Pode até ser em número infinito que eu não me importo. Quando afirmei há tempos que o pensamento tinha de ser matéria não referi, como deves calcular, o tipo de matéria em questão. Disso nada sei! Aliás, eu raciocínio com as estruturas com que fui programado e é por elas que atravesso essa enorme escuridão ou labirinto com que fui premiado ao pertencer a esta classe de mamíferos de que também fazes parte.
VARETT
Faço parte de um conjunto de mamíferos que acredita na espiritualidade...
MANDALA
Parabéns!
VARETT
É-me difícil percorrer o teu caminho, embora, haja nele uma boa dose de lógica humana. E sendo assim, explica-me como é possível tudo ser matéria, não dando hipóteses a que o espírito faça parte também desse labirinto?
MANDALA
Vou fazer uma afirmação: o mau cheiro é um produto final!
VARETT
O que é que isso tem a ver com a questão que te coloquei?
MANDALA
Eu vejo um homem a colher trigo numa ceara. Depois, passado um certo tempo, ei-lo a moê-lo e a juntar-lhe água. Em seguida, leva essa mistura ao forno e fabrica o pão. Alimenta-se dele e depois caga-o. O pão cagado evapora-se. Essa evaporação, que até cheira mal, é um produto final.
VARETT
Cada vez te percebo menos.
MANDALA
Eu quero dizer com isto que a matéria é inteligente.
VARETT
E as pedras da calçada também... Uf!
MANDALA
Claro, tudo é inteligente, na sua própria dimensão!
VARETT
Agora é que eu fujo!
MANDALA
Repara atentamente no que te vou propor. Imaginas-te a viver num planeta que só seja constituído por granito?
VARETT
Não, ora essa!
MANDALA
Vês, onde vives, o granito sustenta várias camadas de terra. Terra que floresce e permite dar continuidade a outros seres. O granito é um ser. A terra, outro ser...
VARETT
Mas, não é o granito que faz a terra!
MANDALA
Eu não disse isso!
VARETT
Então?
MANDALA
Eu não disse que era o trigo que cheirava mal. Achas que se a água estivesse em cima da areia ou mesmo da terra, servia para alguma coisa se não tivesse uma base feita de pedra que a torna suportável? O que eu quero dizer ao afirmar que tudo é inteligente é precisamente querer comparar todos os mecanismos a um feito organizado e orgânico sem distinções a não ser as que detectamos e que são acidentais.
VARETT
Vamos supor que eu vou na tua cantiga e que tudo é matéria organizada e orgânica (salvo seja!). Diz-me onde é que colocas os “géneros materiais” como sejam as emoções, o amor, para não citar outros para já.
MANDALA
Achas que a natureza é económica?
VARETT
Pode ser.
MANDALA
Muito bem. Quando nascem, por exemplo, ilhas no meio do mar, por que razão a maioria delas permanece para sempre? Não haverá aí um aproveitamento na transformação do fogo e de outros elementos numa nova faceta deste planeta? Com a sujeição que estão votadas às estações do ano, não haverá um dirigismo interior que depois as faz florir e frutificar? Estamos de acordo neste processo de “atitude” económica, pois é esta que faz o projecto de transformação.
VARETT
Hum... E quanto às emoções? Não estarás a fugir à questão?
MANDALA
Já lá vamos. Achas que o fogo gosta da água?
VARETT
Que pergunta mais tola!
MANDALA
Vou reformular. O fogo dá-se com a água?
VARETT
Claro que não!
MANDALA
Imagina um mundo só de água, onde não houvesse fogo. Nem mesmo o fogo do Sol quando cá chega. Que aconteceria?
VARETT
A água congelaria e a vida ia ao ar.
MANDALA
Imagina, agora, um fogo enorme que fizesse evaporar toda a água. Achas que dentro das nossas estruturas vivenciais e lógicas haveria lugar para aceitar este tormento?
VARETT
Claro que não!
MANDALA
É que isso implicaria a destruição de um projecto (projecto que nos envolve e do qual nem conheço o princípio nem o fim). Nós fazemos parte desse projecto e é natural que queiramos equilibrar as coisas para não sermos aniquilados. Não sermos destruídos implica uma certa atitude interior e sobretudo exterior. Ao vivermos num mundo equilibrado onde os elementos se harmonizam, o nosso comportamento torna-se empático com a natureza.
VARETT
E as emoções?
MANDALA
Eu acredito que a emoção do medo do desequilíbrio, por exemplo, provém das coisas fundamentais que estão na origem dos “produtos finais”.
VARETT
Como o mau cheiro?
MANDALA
Vamos primeiramente ver se estamos de acordo quanto ao que se pretende que a emoção seja. Suponhamos que acordas e vês um leão no teu quarto deitado ao teu lado na cama. Como ficavas?
VARETT
Leão ou leoa?
Continua amanhã, dia 28 de Agosto de 2006

Saturday, August 26, 2006

 

MENTE EM PÓ
Continuação do dia 25 de Agosto de 2006

SEGUNDA GARRAFA
A questão de as partículas pesarem mais ao transportarem a luz está bem posta. É como digo, a Ciência, um dia, há-de poder pesá-las como também ao pensamento. Pesado e calculado.
MANDALA
Através de cálculos de matemáticos.
SEGUNDA GARRAFA
Há coisas que podem ser medidas e pesadas que estão entre o infinitamente pequeno e o infinitamente grande. Hoje, pode-se calcular o peso da Lua com margens de erro bastante aceitáveis.
(Entra o Silva e dirige-se ao Mandala.)
SILVA
A cervejinha está fresquinha?
MANDALA
Eu já penso que vejo dois Silvas. Será que penso mal?
VARETT
Tu estás com as garrafas.
SILVA
Com as garrafas?
VARETT
Com os copos, quero dizer!
SILVA
AH, mas isso não é novidade! Ele às vezes, corta relações com um de mim que ele vê. Mas que raio de assunto vocês escolheram para estragar o ambiente. Continuo com muita sede.
MANDALA
Só se disseres à malta o que é que entendes por pensamento é que levas mais uma.
SILVA
No outro dia, vi o Mandala beber sete uísques e pensei assim: estás aqui estás a filosofar “doentíces”. E acertei. Ora o pensamento é isto: eu penso eu acerto.
SEGUNDA GARRAFA
Acerta e pensa bem. Cá temos um cartesiano: “eu sou uma coisa que pensa...” Descartes já lerpou. Por isso pesemos o Silva e ficaremos a saber o peso do seu pensamento.
SILVA
Vocês querem pesar o pensamento como quem quer pesar batatas. Nunca se sabe de que é capaz o Mandala. Ele disse que o Deus que me criou não existe. Com Deus não se brinca. Cada pensamento! E este por sinal bem pesado. Tanto que ele quando bater a bota, em vez de subir ao Céu vai de cabeça para baixo. Tal é o peso dos maus pensamentos.
MANDALA
Isto está cada vez mais abandalhado.
SEGUNDA GARRAFA
Antes de nos irmos, gostava de dizer duas palavras.
SILVA
Só se não forem muito pesadas. E já agora, que tal mais uma fresquinha?
SEGUNDA GARRAFA
Quando um homem faz força numa balança pode-se pesar essa força em quilos e gramas. E o gasto que essa força dispensou?
SILVA
(Olhando para o tecto (como se fosse uma nuvem) qual pensador insular.)
Depende! Se for uma balança da praça a coisa não dá. Elas enganam muito.
MANDALA
Cala-te! Um esforço de cem quilos o que é? Que química do organismo se perdeu para além da medida desse esforço? Como pesá-la? O homem irá responder a este problema lógico e a outros. Vai poder medir materialmente o pensamento que corre (não como coisa imaterial) através de um processo químico nos neurónios e não só. Se as informações passam de célula para célula, por que razão não poderão ser quantificadas? Um cérebro que receba e retenha uma informação do exterior, não pesará mais do que outro que não recebeu nenhuma informação? Esperemos que sim. O saber ocupa lugar. Por isso, quando procuramos recordar uma informação e ela não chega de imediato, julgamos que a memória nos falha. Que a perdeu. Depois, dois dias passados lá vem a informação sem termos utilizado auxiliares externos. A informação estava, de certo, em algum lugar, senão ela não teria saído de onde estava guardada. Que gastos de energia sofreu o cérebro quando accionou o processso de busca de informação? Algum gasto deve ter tido... Para onde foi? Esse gasto em peso como pode ser encontrado?
SEGUNDA GARRAFA
Já estou completamente vazia, mas ainda consigo perceber que um cérebro que recebe muita informação pesa mais do que um outro que nada receba. O pensamento é informação e esta não é imaterial!
VARETT
E por que razão o pensamento não é imaterial?
SEGUNDA GARRAFA
Porque pode ser manipulado materialmente.
SILVA
E Deus que não é matéria?
SEGUNDA GARRAFA
Se ele sabe tudo, esse tudo deve pesar qualquer coisita. (Deita-se no chão e rebola (-se) desrolhada e a rir.)
Ave. Príncipe de Mónaco, 22 de Agosto de 2001

(Continua amanhã,dia 26 de Agosto de 2006, com mais uma grande baboseira
de apoio)

Friday, August 25, 2006

 

MENTE EM PÓ
Continuação do dia 24 de Agosto de 2006

SEGUNDA GARRAFA
Vês! E com quem pensas estar a falar neste momento? Comigo ou com o Varett?
MANDALA
Já nem sei!
SEGUNDA GARRAFA
Tu já tens o pensamento embriagado, por isso, vais pedir ao Varett que te explique o que é o pensamento para ele.
VARETT
Eu vou embora. Não estou para dialogar com uma garrafa. O que eu quero dizer é que se o cérebro se embebeda com álcool, isso nada tem a ver com o embriagar o pensamento.
SEGUNDA GARRAFA
Ou o pensamento foge e só volta no dia seguinte ou embriaga-se que nem um lindo.
MANDALA
Para ele se embebedar é porque a sua química se altera.
SEGUNDA GARRAFA
Nem mais, ora percebes?
VARETT
Até com uma garrafa, bolas! Onde me vim meter! Só de pensar na terceira à Montevideu é que fico.
SEGUNDA GARRAFA
Bravo, agora é que é que vai ser bonito! Dois contra um.
MANDALA
Como?
VARETT
Tu, o teu pensamento e a garrafa.
MANDALA
Contra ti e contra o teu pensamento.
SEGUNDA GARRAFA
E já vão cinco!
VARETT
(Para a Segunda Garrafa)
E o teu pensamento, já não conta? (Ri-se)
SEGUNDA GARRAFA
Eu sou apenas companheiro do pensamento.
MANDALA
(Contando com os dedos)
Eu, o meu pensamento, o Varett e o seu pensamento e a Segunda Garrafa. Isto está a ficar feio.
SEGUNDA GARRAFA
(Apontando par a primeira garrafa vazia)
Já não tens companheiro!
MANDALA
A garrafa, a pinga e o pensamento. Estou a ficar como as inglesas bêbedas.
VARETT
Não és tu. É o teu pensamento. (Dá uma forte gargalhada) Deixemo-nos de tretas. Já que o pensamento é material, diz-me quanto pesa o teu?
MANDALA
Duas gramas de Pó de Anjo, palerma! (Ri-se muito)
VARETT
Em vez de estar para aqui à procura de saber o que é o pensamento, por que razão não consultamos um dicionário da especialidade?
SEGUNDA GARRAFA
(Para Mandala)
Faz-lhe a vontade!
VARETT
(Lendo)
Para Kant: “Pensar é conhecer por meio de conceitos.”
SEGUNDA GARRAFA
Que idade tinha ele quando disse isso?
VARETT
Para Malebranche: “O pensamento sozinho é a essência do espírito.”
SEGUNDA GARRAFA
E que gosto tinha a essência?
VARETT
Para Descartes: “ Sou uma pessoa que pensa, isto é, duvida, afirma, nega, conhece... imagina e sente.”
SEGUNDA GARRAFA
Ele disse isso para agradar à Rainha.
VARETT
Já que és tão esperto, diz lá o que é o pensamento?
SEGUNDA GARRAFA
Quando eu pensei que era uma garrafa cheia, dei por mim...
VARETT
Há pouco não pensavas. Eras o companheiro do pensamento...
MANDALA
Cala-te!
SEGUNDA GARRAFA
Isto às vezes é toma lá dá cá... Dei por mim vazia ou quase. Quando estava cheia, estava alegre. Agora que estou vazia estou triste. Quando cheia, o meu pensamento era cheio e pesado. Agora é leve. Sou como o soldado que a mina levou parte do cérebro e começou a pensar diferente. Parte dele que voou para o chão pesava qualquer coisita. Esta parte do cérebro continha uma forma de pensar que se foi. O pensamento instalado nessa parte do cérebro tinha lá o seu espaço. Pesava qualquer coisa? Eu penso que sim. Pelo menos o que valia a sua reacção química. Um dia os homens da Ciência hão-de poder pesar o efeito dessa química e aí teremos o seu peso.
VARETT
Esta de pesar o pensamento...
MANDALA
As partículas que conduzem a luz não têm “peso”? E quando a conduzem não pesam mais do que se não as transportassem?
VARETT
Pede a balança na mercearia da esquina.
Continua amanhã, dia 26 de Agosto de 2006

Thursday, August 24, 2006

 

MENTE EM PÓ
Continuação do dia 23 de Agosto de 2006

MANDALA
Sexo?
VARETT
Sim. Sexo puro!
MANDALA
E de manhã, quando a tua avó dava pelos lençóis manchados e sujos?
VARETT
Tu não prestas para nada!
(Gargalhadas...)
MANDALA
A questão que quero repescar é se o pensamento é material ou se é apenas um veículo daquilo que é material. Digamos, um parente próximo.
VARETT
O pensamento não é material. Eu sinto isso.
MANDALA
Sentes, como? (Ri-se)
VARETT
A matéria foi aquilo com que iniciámos esta merda de conversa.
MANDALA
Pensa num prato de que gostes muito.
VARETT
Prato sexual?
MANDALA
Não, minha besta! Paparoca!
VARETT
Lagosta... que saudade.
(Mandala dirige-se ao frigorífico e de lá retira uma travessa com lagosta preparada à Montevideu.)
MANDALA
Papa-a, esta é à Montevideu!
(Varett atira-se à lagosta de mais ou menos um quilo e devora-a sofregamente.)
VARETT
(Limpando os lábios com as costas da mão)
Estava um espanto!
MANDALA
Prepara-te para ouvir como é que eu confeccionei esta lagosta à Montevideu.
VARETT
Não estou interessado, ela já cá canta!
MANDALA
Ai, ele é isso! Pois aquilo que julgavas que acompanhava a lagosta e que deviam ser trufas picadas, eram nem mais nem menos do que baratas que apanhei na cozinha. Ah! Ah! Ah!
VARETT
Bandido! (Vomita tudo)
MANDALA
Mentira! Mentira! Mentira!
(Mandala dirige-se novamente ao frigorífico e retira outra lagosta que dá a comer ao amigo que a devora rapidamente, perdoando-lhe o dislate.)
VARETT
(Depois de ter devorado a segunda lagosta.)
O que tu fazes para ganhar uma discussão. O que vale é que contigo sempre se aprende sacanices.
MANDALA
Papas-me duas lagostas e ainda me chamas sacana. Isto só visto! Tu és um açorpiteco de uma fila micaelense. Diz-me cá uma coisa. Quando te falei nas baratas, foram estas ou a imagem delas que te provocaram vómitos?
VARETT
Eu não vi baratas vivas. Foram as imagens delas que me provocaram os vómitos. E, neste caso, todas as imagens têm, para mim, um agente provocador de situações. Será necessário referir aquele borracho que me ensinava inglês?A matéria e a ideia fazem-te confusão.
MANDALA
Sempre ouvi dizer que o pensamento é sempre o pensamento de alguma coisa. Se admites o contrário, justifica-o para não estarmos a perder tempo. Pensa noutra à Montevideu.
VARETT
Chantagista! O pensamento pode ser puro!
MANDALA
Pode ficar tão puro que ficará reduzido a merda, perdão a nada.
VARETT
Eu posso pensar no nada!
MANDALA
Explica-te senão eu julgo que o pensamento fica reduzido a nada.
VARETT
É isso mesmo!
MANDALA
(Voltando-se para a Segunda Garrafa de uísque que começara a beber.)
Vês, o pensamento para este é nada...
VARETT
Não foi o que eu disse. Tu queres confundir-me!
MANADALA
Em que é que ficamos? Ou o pensamento é nada ou é o intermediário da coisa?
VARETT
Seja o que tu quiseres...
MANDALA
Achas que os animais pensam?
VARETT
Esta agora! Só os racionais1
SEGUNDA GARRAFA
(Para Mandala)
Os animais também pensam. Só que o fazem na sua própria dimensão.
MANADALA
(Para a Segunda Garrafa)
Como podes afirmar tal coisa?
SEGUNDA GARRAFA
Abre a goela à tua Kalix (cadela de estimação) e vê se eu não lhe chego ao cérebro? Derrama-me bem lá dentro!
MADALA
De facto, o álcool é o único que pode percorrer aqueles “corredores” , apesar de a ciência estar por lá perto...
Continua amanhã, dia 25 de Agosto de 2006

Wednesday, August 23, 2006

 

MENTE EM PÓ
Continuação do dia 22 de Agosto de 2006

MANDALA
Nunca ouviste dizer que aquilo que faz com que o o lápis friccionado atraia papelitos é a electricidade? Experimenta pensar um lápis um milhão de vezes maior e que foi friccionado numa camisola de lã um milhão de vezes maior do que a primeira referida atrás. Aplica a força inicial da fricção também um milhão de vezes mais. Por acaso adivinhas o que te aconteceria se esse lápis passasse perto da tua cabeça?
VARETT
Não!
MANDALA
Queimava-te o toutiço!
VARETT
Queres com isto dizer que um cabeçudo terá mais electricidade do que eu ao pensarmos a mesma coisa simultaneamente?
MANDALA
Tu o dizes e dizes bem. Cada um tem um índice de energia próprio. Se tu beberes uma cerveja, acusarás maior grau de alcoolémia do que o senhor Pavarotti, por exemplo, dizem as más línguas.
VARETT
Percebi muito bem. Enquanto eu me embebedo ele canta de alegria. Se um dia sonhares comigo e nesse sonho eu te bater espero que fiques com um olho negro.
MANDALA
São dimensões de energias diferenciadas. A própria sensação de dor no sonho, depois de levares um bom sopapo, não a podes deixar de considerar.
VARETT
Penso que no sonho aquilo que se manifestou foi o apelo a um referente. Tendo esse referendo sido o diapasão, mas nunca um acto sensível e comensurável.
MANDALA
Se recordares o cheiro de um perfume sem o teres por perto, aproximas-te do odor real? Será o reviver da imagem ou o reviver de uma sensação odorífera?
VARETT
De imagem, creio eu.
MANDALA
Não será uma imagem com odor? É que só se tiveres imagem, não creio que chegues lá. Imagina duas mulheres com o seu perfume particular. A cada uma se liga a imagem ao odor próprio! Não será?
VARETT
Penso que posso separar qualquer delas do perfume a que pertencem e reter a imagem simplesmente.
MANDALA
E que fazes tu ao odor?
VARETT
Desassocio-o pura e simplesmente.
MANDALA
Armazenas-lo em algum “local”?
VARETT
Talvez.
MANDALA
Qual dos dois, a imagem da mulher ou a sensação de odor mais ligas aos sentidos?
VARETT
A sensação do odor.
MANDALA
Não te esqueças que os sentidos sentem. Dão-te uma sensação de... e há momentos fazias apelo à imagem.
VARETT
A imagem da mulher pode sugerir uma sensação estética. Teríamos, assim, duas sensações e eu distingo-as.
MANDALA
Concordo para já. E se acordares de um sonho com imagem e odor, não ficarás com estas duas sensações prolongadas por algum tempo?
VARETT
Às vezes até à hora do almoço...
MANDALA
Olha para ele cheio de química! E a química mede-se.
VARETT
Ena pá, no começo desta conversa querias que eu ficasse com um olho negro sonhando. Que mais queres?
MANDALA
Queria que dobrasses uma colher concentrando-te nela. Se não consegues realizar este tipo de jogo mental, diz-me se alguma vez ejeculaste ao sonhares que fornicavas com alguém muito excitante?
VARETT
Quando sonhava com a minha professora de Inglês, que era cá um borrachão.
MANDALA
Uau meu! E atingias o orgasmo só com a imagem, seu maroto?
VARETT
Por vezes, não distinguia o real do sonhado. Minha avó ao acordar-me chamava-me porquinho por causa dos lençóis...
MANDALA
A mente, meu caro, trabalha com referentes materiais ou materiais distorcidos.
VARETT
E então, os seres abstractos?
MANDALA
São desvios da mente. A abstracção é uma doença. E as doenças do género tratam-se.
VARETT
Acudam que este já emborcou uma canada de uísque e já não sabe o que diz!
MANDALA
Vamos falar do real. O que é este para ti?
VARETT
É o que eu penso dele (da coisa).
MANDALA
E se pensares mal, melhor dizendo, se tiveres hipóteses de chegar a ele com rigor? De que tipo de real és tu possuidor?
VARETT
O meu real!
MANDALA
Mas podes considerá-lo um desvio, uma vez que o teu real pode não sê-lo em relação a outrem?
VARETT
Tudo é possível...
MANDALA
O teu real sofre de disfunção, o que é possível. Se os teus sentidos te enganarem como chegarás a ele?
VARETT
A verdade, o real, o lógico estão comigo. Sempre estiveram.
MANDALA
A imagem da tua professora de Inglês esteve sempre contigo ou começou a dar sinais de existência quando te sentaste nos bancos do liceu?
VARETT
Sacana! Isso é outra conversa. Isso é sexo!

Continua amanhã, dia 24 de Junho de 2006

Tuesday, August 22, 2006

 

MENTE EM PÓ

Continuação do dia 21 de Agosto de 2006

MANDALA
Se num sonho, eu partir uma perna, isso será diferente da realidade, como é óbvio. Não é por aí que eu quero ir. Segue-me, pois, com atenção. Sabias que se ligares aparelhos sofisticados ao teu cérebro, que aqueles detectam energia suficiente para aecender uma lâmpada de micropotência.
VARETT
Nunca tal ouvi! Será a ideia luminosa?
MANDALA
Tu fazes-me rir com a tua lógica. Se o cérebro é um interlaçado de energias, é provável que quando se gera o pensamento nele, haja, de facto, um conjunto de hipóteses em aceitá-lo como forma de energia. Nunca recebeste uma mensagem telepática?
VARETT
Lá isso é verdade. Aconteceu-me uma ou duas vezes na vida. Aliás, conheço uma pessoa que as recebe com mais frequência.
MANDALA
Se a telepatia existe, não deixa de ser uma forma de energia que utiliza canais (ondas) para que emissor possa enviar a mensagem.
VARETT
E o pensamento, que papel tem nesta lenga-lenga?
MANDALA
O pensamento é uma forma de energia que para além de darmos por ela é também armazenada. E quando surge a oportunidade, vamos procurá-la no armazém, para nos servirmos dela.
VARETT
Explica-te melhor!
MANDALA
Se gravares o teu pensamento materializado em palavras num gravador podes sempre que o queiras ouvi-lo novamente.
VARETT
Às vezes, a fita gasta-se e nada se ouve. Ah! Ah!
MANDALA
É que a energia que ela possuía foi dispersada pelo agastamento. Nunca deste por ti a tentar relembrar um certo pensamento e este surge mutilado?
VARETT
Sim, várias vezes.
MANDALA
E depois de várias tentativas para o conseguires recriá-lo totalmente, ele surge-te completo?
VARETT
Sim, mas as fitas não.
MANDALA
Nem sempre. Já existem técnicas de recuperação tão boas que te fornecem o original tal qual ele era.
VARETT
E onde nos leva esta conversa?
MANDALA
Há energia que não se vê e está algures. Por vezes, para a vermos actuar é necessário provocá-la.
VARETT
E quanto ao pensamento?
MANDALA
A energia do lápis que surge após a fricção numa camisola de lã vai para qualquer sítio. Assim, também, o pensamento, como forma de energia, segue o mesmo caminho. Tu não podes recordar um sonho sem que algo energético tenha a força de o trazer à consciência do facto. Tu, no sonho, foste, de facto, agredido. Só que numa dimensão distinta. Agredido internamente, pois um soco real vem de fora para dentro. A questão é pois outra.
VARETT
Caramba, o que tu inventas!

Continua amanhã, dia 23 de Agosto de 2006

Monday, August 21, 2006

 

MENTE EM PÓ

PREDITO
O problema de se saber o que é o pensamento não se resolve com invenções de cada um... Mais invenção menos invenção, o certo é que se está ainda muito longe de o caracterizar com rigor científico. Sempre que o sujeito faz apelo ao pensamento, quer seja por recordação retardada, quer seja por utilização imediata dos seus constituintes, a componente energética é uma constante. O pensamento faz-se “sentir” como elemento sustentado. Todas as vezes que ao pensamento surgem ideias ou impressões de ideias, elas são suportadas por uma energia que se apresenta gradativamente, pois, há ideias mais positivas do que outras no sentido de maior ou menor forte impressão no sujeito pensante. As ideias são algo detectável. Ao fazer apelo a um discurso de ideias, o sujeito pensante utiliza cópias de ideias (fotocópias), cujo original está conservado em determinado espaço. Dizem alguns que esse espaço se localiza no cérebro. O cérebro pode ser uma máquina ao serviço de um centralismo de órgãos “independentes” que podem estar em conexão na construção de ideias. Se o cérebro envia informações (trata-se de cópias de originais que se encontram retidos para posteriores utilizações) para os diversos órgãos, não serão eles (os órgãos) um sistema de interpretação cerebral? Não basta enviar uma informação a alguém. Esse alguém terá de interpretá-la. E se a interpreta, é porque “percebe” de cérebro, isto é, ele também é uma espécie de cérebro. É que as informações e ordens enviadas pelo “patrão” não caem em saco roto. Alguém as percebe e reage em conformidade...
VARETT
Ainda o outro dia, num sonho, tive a sensação que me batiam. Estav num beco escuro e um vulto agrediu-me.
MANDALA
O sonho de que foste paciente foi materialmente sensibilizado no momento da agressão.
VARETT
Não fui propriamente agredido. O que afirmas é uma forma de dizer. O que se passou teve lugar num sonho. Não foi real. Não foi material.
MANDALA
Diz-me uma coisa. O que é para ti a matéria?
VARETT
Os antigos diziam que era a terra, a água e o fogo. Os físicos de hoje até falam em antimatéria.
MANDALA
E o ar que às vezes até derruba árvores?
VARETT
Sim, também o ar.
MANDALA
Estamos rodeados por essa matéria referida?
VARETT
Sim, mas mais acima, não há oxigénio. O espaço sideral nada tem destas coisas no seu conjunto, senão haveria vida como a nossa.
MANDALA
Por enquanto não sabemos. Senão o que a ciência nos transmitiu. Voltemos à questão da agressão.
VARETT
Agressão no sonho. Repito!

Continua amanhã, 22 de Agosto de 2006

Sunday, August 20, 2006

 

CADERNO DO OLHAR IV - FIM


CADERNO DO OLHAR IV
Continuação do dia 19 de Agosto de 2006

MANDALA
Não sendo sábio, vou tentar responder como me for possível dentro deste meu sistema. A sobrevivência surge desde o começou de tudo. A sobrevivência gere harmonia como o que é criado e não como o que é criador. A harmonia é um fim e não um começo. No que diz respeito ao homem, este não é mais do que uma peça embrionária sempre em crescendo até que se transforma na consciência do Universo, que é uma das metades da harmonia. A harmonia é um composto de ordem material e de ordem de conhecimento. Os dois juntos dão forma e conteúdo ao que ainda não sei rigorosamente explicar de outro modo. Daí para a frente foge ao meu entendimento. Talvez daqui a um bilião de anos possa explicar se ainda estiver por cá. No caso do amor, eis como o vejo: no planeta Terra distinguimos quatro estações. Numa delas florescem certas plantas que produzem frutos noutra estação. Nos dias de hoje, sabe-se que podemos determinar através da engenharia genética algumas características futuras do próprio homem. Poder-se-á dizer que o homem está em certa medida programado. Em determinada altura do seu crescimento observamos tendências para procriar que são insuperáveis. A mulher moderna que actua como o homem em empresas de grande competição também cai na esparrela da procriação que a natureza lhe reserva. Passado tempo, arrepende-se... Entretanto, a natureza cumpriu nela o seu ciclo programado. O amor passa a saudade. Foi geracional! Amor e procriação são formas de sobrevivência. São elos de uma cadeia em progressão com um objectivo: harmonia. A harmonia final tem alguma parecença com as harmonias de percurso que não são perfeitas porque mutáveis.
SENORIÃO
São e não são harmonias.
MANDALA
Claro! A harmonia final, esta, talvez, venha a ser imutável. Eu não sei se alguma vez o será...
FIM – 27 de Dezembro de 2001
(Amanhã apresentar-se-á textos de apoio a estes Cadernos do Olhar. Outras coisas tão confusas como eles.)

Saturday, August 19, 2006

 

CADERNO DO OLHAR IV


CADERNO DO OLHAR IV
Continuação do dia 18.8.06

MANDALA
Meu caro, não lê jornais, não vê televisão, não ouve rádio?
SENORIÃO
Estou actualizado!
MANDALA
Ainda bem! Vamos supor que depois desta nossa conversa se passavam trezentos biliões de anos. Sabe que o homem da Terra terá possibilidade de vir a povoar outros planetas e até outras galáxias?
SENORIÃO
Certamente. Estou a ver milhares de planetas com condições de vida para o homem poder lá viver transformados em verdadeiros viveiros.
MANDALA
Decuplica os trezentos biliões de anos vezes sem conta.
SENORIÃO
Estou a tentar...
MANDALA
O Universo polvilhado de consciência humana. Uma grande cabeça. Um grande sensor religioso dado que é ao homem que cabe pensar a religião. Pensar, meditar, tornar as coisas com sabor religioso fazem parte da sua estrutura e crescimento. Acreditando ou não no factor religioso em si, independentemente de subjectivismos de cada raça, o homem não pode deixar de o considerar. Uma tão grande consciência humana não deixaria de ser, ao lado da ordem universal, uma grande consciência do Universo. Obteríamos, assim, uma possibilidade de haver um equilíbrio entre eles. Este equilíbrio seria provavelmente uma apetência para a harmonia tão ao jeito do Universo.
SENORIÃO
Harmonia?
MANDALA
Pode ter outro nome!
SENORIÃO
Deus?
MANDALA
À vontade do freguês!
APÓS O DIÁLOGO
SENORIÃO
Queria que me explicasse o conceito de sobrevivência no final dessa harmonia por si inventada. Como surge o homem? O porquê da existência entre os seres?
Continua amanhã, dia 20 de Agosto de 2006

Friday, August 18, 2006

 

CADERNO DO OLHAR IV - CONT.


CADERNO DO OLHAR IV

Continuação do dia 17 de Agosto de “2006

SENORIÃO
Julgo que nenhum!
MANDALA
Claro1 Assim como as comunidades primitivas não precisavam nem de abades nem de bispos porque se limitavam a sobreviver. No entanto, com o passar dos tempos, ei-los com feiticeiros que depois deram lugar aos sacerdotes e pr aí em diante.
SENORIÃO
O Universo naõ é um corpo com vida. A vida existe nele num determinado ponto.
MANDALA
O que mexe é igual a vida. O homem é um ser com vida. Essa sua afirmação não passa de um enacapotado antropomorfismo. Dizer que as plantas e os animais são os únicos possuidores do dom da vida é não querer olhar o homem como um constituinte diferenciado do Universo. Sendo parte do mesmo Universo e dele retirando a substância de que é feito não é estar a fugir à sua identidade o facto de não aceitar que tudo é vida?
SENORIÃO
Não vejo onde está o sensor religioso do Universo?
MANDALA
De uma coisa temos a certeza. O homem é um ser que pensa o religioso. As pedras, os planetas, os sóis e outros que tais não o fazem. Não apresentam esta característica.
SENORIÃO
já sei. O homem, melhor a globalidade dos homens é o sensor religioso do Universo. Ah! Ah!
MANDALA
Os homens poderão ser considerados o sensor religioso. Só que estamos sujeitos a que “outros homens” de outros espaços tenham em relação a nós outro estatuto. Estaríamos para eles como o feiticeiro está para o bispo.
SENORIÃO
Ou vice-versa!
MANDALA
Nem mais!
SENORIÃO
Que tipo de sensor religioso pode ser considerado o homem ou outro homem do Universo se ele nada manda na ordem que rege o mesmo Universo?
MANDALA
Parece à primeira vista que o sensor religioso das nações mais evoluídas não têm peso. Porém, não é assim. Vejamos o seguinte: o sensor religioso influi no desenvolvimento da sociedade. Sabemos o quanto às vezes interfere no sector político.
SENORIÃO
Senhor Mandala. Que influência terá a cabeça religiosa, o tal sensor religioso do Universo, na ordem física do mesmo? Não poderemos denominar esse seu sistema de uma diatribe?
Continua amanhã, dia 19 de Agosto de 2006

Thursday, August 17, 2006

 

CADERNOS DO OLHAR IV


CADERNO DO OLHAR IV

Continuação do dia 16.8.06

SENORIÃO
Estas questões não são fáceis de entender e aceitar. Compreendo até onde quer chegar. Só que o argumento não é tão demolidor quanto devia ser.
MANDALA
Aceito a crítica. Mas vamos procurar entender-nos. Quando Cristo falava de amor ao próximo, os seus compatriotas judeus que o escutavam sabiam ou não do que se tratava?
SENORIÃO
Claro que sabiam, mas não aceitavam!
MANDALA
Eu perguntei se eles sabiam ou não do que ele pregava. Para já é o que interessa. Aceitar ou não é outra questão.
SENORIÃO
Sabiam!
MANDALA
Cristo fez um arranjo com palavras e sentimentos conhecidos de todos eles. Cristo é um prolongamento erudito e religioso daquele grupo. Cristo não falaria nem pregaria para si próprio. Seria um absurdo. O que se verifica é um grupo e seu prolongamento.
SENORIÃO
Além de Cristo, não havia, ao tempo, outros prolongamentos do seu grupo?
MANDALA
Óbvio! O Sumo Sacerdote, por exemplo, é um dos prolongamentos dos judeus da altura.
SENORIÃO
Então, cada judeu, no caso de se isolar, seria um prolongamento?
MANDALA
Diz bem! Se se isolasse, pregasse e pensasse alto por que não? Se interpretasse as aspirações do grupo, por que não? Os grupos dão origem aos prolongamentos que fazem parte integrante deles mesmos.
SENORIÃO
Voltemos um tudo nada atrás. Lembrei-me de que as tartarugas vivem isoladas.
MANDALA
Parece. Têm tempo para as relações sexuais. Podem viver muito tempo isoladas porque os oceanos têm uma dimensão enorme. Mas isso é a nossa análise. Para as tartarugas o caso é certamente distinto.
SENORIÃO
Fico com a sensação de que este discurso é demasiado facilitador e peca por não referir com rigor a observação.
MANDALA
É uma teoria e como tal serve para conversarmos. Nem está em causa registar a patente...
SENORIÃO
Demos um grande trambolhão. Isto é, das duas cabeças do Universo aos seus prolongamentos vai uma eternidade. Gostava de saber quando é que se pode ver as duas cabeças do Universo?
MANDALA
No começo das minhas observações chegamos à conclusão de que os grupos humanos eram orientados por duas grandes forças. As quais denominei de poder político e poder religioso. Existem outros tipos de poder, mas sempre subserviente àqueles.
SENORIÃO
E o poder económico?
MANDALA
Existem períodos em que o poder económico orienta os grupos. Porém, trata-se, quando acontece, de curtos períodos que podem ser explicados porque o poder político enfraquece por corrupção, incapacidade de organização, falta de determinação política, aproximação demasiado perigosa ao poder religioso. O poder económico resguarda-se no poder político. Pode, até, condicioná-lo, mas nunca o domina completamente. Não é usual em permanência. Senão quem dirigia politicamente os grupos eram os empresários, empreiteiros e outros que tais. O que aliás não acontece se não esporadicamente. Assim, como não acontece a não ser esporadicamente um barbeiro só por ser barbeiro ser ministro.
SENORIÃO
Eu sei de um ministro que foi barbeiro.
MANDALA
A Comuna de Paris ofereceu esse exemplo. Uma famosa excepção.
SENORIÃO
Em que ficamos?
MANDALA
Vou resumir. Numa vilória temos a Câmara Municipal e a Igreja Paroquial que são os órgãos máximos locais. Os outros órgãos de autoridade são adjacentes. Aumente-se a ideia e veremos a organização de nações, países, etc.
SENORIÃO
Percebi a ideia. Voltemos ao Universo e às duas cabeças. Que são elas?
MANDALA
Olhemos o Universo como se dele estivéssemos muito distanciados. Que poderemos dizer dessa coisa fantástica?
SENORIÃO
Que existe uma ordem e uma organização impecáveis.
MANDALA
Que existe um Sol que nos dá vida e nos aquece.
SENORIÃO
Ele há muitos sóis!
MANDALA
Certamente darão calor e vida a outros planetas e a outros seres. Paremos um pouco na ordem como um dado adquirido. A ordem domina o Universo. Digamos que é a cabeça da politica do Universo. Esta cabeça é um sensor vital para manter a harmonia entre as coisas que existem nele.
SENORIÃO
Que é feito do sensor religioso?
MANDALA
Existe uma ordem. Nisso estivemos de acordo. A ordem existe nela mesma, porém, ideia de ordem não é ela que a elabora. A ideia surge numa outra dimensão.
SENORIÃO
Essa de retirar a ideia de ordem à ordem do Universo é para confundir. Esquisito.
MANDALA
Imaginemos que só havia uma ordem. Qual era o problema?
Continua amanhã, dia 18 de Agosto de 2006

Wednesday, August 16, 2006

 

CONCLUSÃO DO CADERNO DO OLHAR III - INÍCIO DO CADERNO DO OLHAR IV


CADERNO DO OLHAR III
Continuação do dia 15 de Agosto de 2006

MANDALA
O homem sabe muito pouco acerca dele mesmo e acerca dos animais muito menos. Será preciso fazer-se muita observação e muito estudo para nos pronunciarmos sobre uma matéria que está a dar os primeiros passos, liberta das afirmações gratuitas do passado. A realidade sobre a vida dos nossos companheiros de planeta é bem diferente daquilo que nos contavam as nossas avós à cabeceira do sono.
VARETT
O que é lá isso! Agora o homem é um ignorante?
MANDALA
Não, que ideia. Até há homens que falam directamente com o Criador.
VARETT
Sim, tens dúvidas? Há uma velhinha que em Portugal falou cara a cara com a Mãe de Deus.
MANDALA
Essa gente deve saber muito... muito...
VARETT
Foi pena os videntes não terem aproveitado os sagrados contactos para recolherem mais informações.
MANDALA
Sobretudo científicas e tecnológicas.

FIM DO III Cap.

CADERNOS DO OLHAR IV Cap.

Personagens
Varett, Mandala e Senorião

VARETT
Apresento-te um amigo a quem reproduzi as tuas últimas viagens.
MANDALA
Viagens?
SENORIÃO
Perdoe-me a intromissão senhor Mandala. Varett brinca com as palavras. O que ele quer dizer é que eu fiquei curioso. Outros, também, ficaram na mesma...
MANDALA
Eu tenho tentado transmitir o meu pensamento, mas em vão.
VARETT
Senorião, eu não te dizia!
SENORIÃO
Gostaria que me explicasse como é que acaba essa sua invenção, uma vez que o começo dela foi-nos comunicado com muito entusiasmo crítico por este nosso amigo comum.
VARETT
Eu vou encostar-me neste divã porque sei aonde é que isto vai parar.
MANDALA
MANDALA
Caro Senorião, vejamos oseguinte: o Universo é um corpo com duas cabeças.
VARETT
(Dando um salto)
Eu vou fugir daqui! Adeus!
MANDALA
Veja lá isto, Senorião.
SENORIÃO
(Para Varett)
Encontramo-nos mais tarde. Quero ouvir Mandala. Senhor Mandala, onde estão essas duas cabeças do Universo?
MANDALA
Essas duas cabeças vão surgir num determinado tempo. Não sei quando. Tudo cresce ou modifica-se. As cabeças acabarão por “aparecer”. No início das minhas deambulações apercebi-me de que não existe nada de individual à nossa volta.
SENORIÃO
Eu sou um indivíduo. Você é outro. Explique-se para poder segui-lo.
MANDALA
Repare que os indivíduos existem como prolongamento do grupo a que pertencem. Um Grupo Corpal.
SENORIÃO
Grupo Corpal?
MANDALA
Tudo o que se observa em termos de animais, por exemplo, é formado por um conjunto. É um corpo em grupo. As abelhas, as formigas, os ursos, os leões, os macacos, etc.
SENORIÃO
Os leões, que eu saiba, vivem em separado. As fêmeas e as crias por um lado, os grandes machos pelo outro.
MANDALA
São um grupo. Apesar de haver distâncias entre os subgrupos, pensam em conjunto, actuam em conjunto, comem em conjunto. Os leões espaçados ou não, formam um conjunto de leões.
SENORIÃO
“Os indivíduos existem como prolongamento do seu Grupo Corpal”. Não compreendo a sua afirmação.
MANDALA
Um individuo como o homem, por exemplo, fala porque é ensinado pelo grupo. Quando age e actua deve-o ao grupo que lhe forneceu a aprendizagem devida. O próprio pensamento individual é fruto do pensamento do grupo, umas vezes repetido outras transformado, aumentado, influenciado, interactivado, etc. Por isso é que eu digo que quando o indivíduo se formaliza não é mais do que uma continuidade do grupo a que pertence. Como não está separado é um prolongamento. Ele encontra-se ligado ao Grupo Corpal. Este não é o prolongamento do indivíduo, mas o contrário sim.
SENORIÃO
Um Cristo, um Santo Agostinho, um Hitler, um Estaline são prolongamentos? Não é cada um deles um ser singular e independente do seu grupo?
MANDALA
Até que por “princípio” e por descuido poderíamos considerá-los singulares. Não são casos singulares se atendermos ao facto de que cada um deles encarna o que muitos foram no grupo a que pertenceram.
SENORIÃO
Foram, até que se aceita. Mas quando se assumem como seres isolados imbuídos de particularidades que os distinguem do grupo mais não são do que seres diferentes no pensar e no agir. E isso torna-os únicos.
MANDALA
Cristo repetiu e reformulou o pensamento antigo proveniente do Universismo Chinês cinco séculos atrás ao seu nascimento. Hitler e Estaline, ambos racistas e carniceiros – a história prova-o – não foram mais do que meros prolongamentos dos grupos a que pertenciam. É neste sentido que são retratados. Repare-se que eles pensaram e mandaram actuar de acordo com os seus grupos que os idolatraram e aplaudiram. Se não fossem compreendidos e não interpretassem esses grupos teriam sido por eles considerados loucos. Quando tudo corria bem para todos foram adorados como deuses. Depois, foi o que se viu.

Continua amanhã, dia 17 de Agosto de 2006

Tuesday, August 15, 2006

 

CADERNO DO OLHAR - CONT. DO DIA 14.8.06


CADERNO DO OLHAR III – CONTINUAÇÃO DE 14/8/06

PACKETA
Se não tens Fé, estás lixado!
MANDALA
A ideia de Fé está relacionada com uma ânsia de permanência e de auxílio a esta por um lado. Pelo outro, há o querer que ela exista permitindo toda a exequibilidade de uma série de aspirações que se limitam ao circulo do indivíduo. Hoje, lida-se com o stress como quem lida com falta de apetite. Salientemos o facto de que na Igreja de Roma o confessionário, como prática soprada pelo divino, estar a perder terreno nos países ricos e a ser substituído pelos consultórios dos psicanalistas. O Corpo Central está sujeito à evolução. Aliás, assim como todo o Universo. Assim como os feiticeiros deram lugar aos cultos e sábios sacerdotes, assim o confessor cedeu lugar ao clínico.
VARETT
E a eternidade?
MANDALAO teu Deus criou tudo?
VARETT
Tudo!
MANDALA
E a eternidade?
VARETT
Se todo criou, é lógico que a criou também como entendimento.
MANDALA
Se isso fosse assim como tu dizes, a ideia de eternidade não seria tão completa. A eternidade dos homens seria menor em relação à eternidade de Deus. Teríamos de entender a eternidade axiomática. Duas eternidades: a de Deus e a outra que até tem um começo. Menos eterno não é uma forma lógica. Pelo menos a nível clássico. Deus é eterno, porém, o eterno não é Deus. A eternidade não tem forma. E que forma terá a alma do homem na eternidade? A eternidade não é espaço...
PACKETA
Pareces um antipadre!
MANDALA
Imaginemos o seguinte: dois homens acreditam em Deus. No entanto, um deles acredita menos um todo nada. Será que posso afirmar que um tem um Deus e o outro um Deus menos qualquer coisita.
VARETT
Que disparate! Ou se acredita ou não se acredita. Não há partes de Deus!
MANDALA
Que é isso de acreditar em Deus?
VARETT
Seguir a sua palavra. Seguir as suas obras.
MANDALA
Seria bom estudarmos outros deuses e suas palavras. Que eu saiba, com o avanço da ciência, da tecnologia, do pensamento discursivo que as acompanha. Já ninguém acredita com tanta certeza nos intérpretes que aparecem por aí. Começa-se por duvidar de tudo. E as certezas do passado não passam, algumas vezes, de baboseiras. Quando se descobriu a pílula e o trabalho externo para as mulheres, as religiões da pureza começaram a perigrar nas estruturas. Aquilo que antes era considerado um grande pecado e que levava os prevaricadores a ficarem impedidos, depois de morrerem, de usufruírem da presença de Deus (segundo os intérpretes mais fundamentalistas) é, nos dias de hoje, uma grande treta. Actividade sexual é considerada tão necessária quanto uma refeição. Os deuses modernos vão ficando reduzidos à festa porque os seus associados já começaram a enfadar-se com o pouco significado dos sacrifícios. E tudo leva a crer que os altares desses deuses se transformarão em balcões de snackbares.
VARETT
Isto realmente não leva a nada!
PACKETA
Estas questões não podem ser tratadas pelos teus Corpos Centrais. Todo o indivíduo tem capacidade para lidar com este problema sem dar satisfação a ninguém. O Corpo Central só existe na tua cabeça.
MANDALA
Lá isso é verdade. O Corpo Central tem dificuldade saltar para a tua cabeça.
PACKETA
Diz-me uma coisa. Um cardume de peixes é a soma de muitos peixes ou é só um peixe? Faço-te esta pergunta tendo em conta a tua posição inicial.
MANDALA
Um cardume quando é atacado pelos predadores transforma-se num único animal com actividade e vida próprias. O predador ataca no centro e na lateral do “animal” matando centenas ou milhares dos seus constituintes. Depois de estar saciado, o predador deixa o que resta dele em paz. Quando estão a ser atacados os peixes formam um todo único em vez de fugirem cada um para o seu lado.
VARETT
Os homens também se mobilizam num todo quando fazem guerra contra outros homens.
PACKETA
Os predadores matam os chefes dos cardumes?
MANDALA
Matam. Mas não tem problema porque rei morto rei posto. O Corpo Central recria novamente um chefe, isto é, surge de dentro dele uma cabeça para os liderar e orientá-lo na sua sobrevivência.
VARETT
Agora, até os peixes têm um Corpo Central. Daqui a pouco ele está a dizer
que o cardume também tem um feiticeiro. Ah! Ah!

Continua amanhã, dia 16 de Agosto de 2006

Monday, August 14, 2006

 

CADERNO DO OLHAR III


NOVO CAPÍTULO

CADERNO DO OLHAR III

PERSONAGENS
PACKETA, VARETT E MANDALA

PACKETA
Criaste uma analogia quando pensaste que uma comunidade ou uma nação podiam ser consideradas como um todo (corpo) com uma ou duas cabeças conforme a evolução desse mesmo corpo. Um corpo dito Central que não será nem mais nem menos do que a organização sócio-económica do homem. As duas cabeças que representam os que dirigem o Corpo Central são os sensores. A um atribuíste o governo político e ao outro o governo das ideias ligadas à actividade protectora transcendental. Posso continuar ou errei na apreciação?
MANDALA
Até aqui acho correcta a leitura, embora deva dizer que procuro um sistema e não uma analogia. Tudo bem, podes continuar.
PACKETA
Penso que se trata de um raciocínio por analogia. Não será?
MANDALA
Se eu puder provar que o Corpo Central juntamente com os dois sensores são uma comunidade humana , não ficarei retido apenas no comparativo para precisar o meu pensamento.
PACKETA
Quem analogizou foste tu!
MANDALA
Certo! Era para nos entendermos melhor. Erro meu! Também tenho o direito se errar.
PACKETA
Eu sei aonde queres chegar. Mas por aí não vou.
MANDALA
Claro, errar para depois acertar é mais edificante do que acertar às cegas. Continua.
PACKETA
Se quiseres criar um sistema tudo tem de ser coerente nas explicações e deduções referentes a ele. Senão não é nenhum sistema. Não compreendo como é que a ideia de divindade é posterior à de político?
MANDALA
Foram encontradas tribos humanas que no fim do século passado não tinham tido contactos com a chamada civilização. Não possuíam qualquer ideia de divindade. Porém, geraram um líder que os chefiava e os resguardava dos perigos. Serve para esclarecer?
PACKETA
Não!
MANDALA
No começo da humanidade não cabe muito bem a ideia de um líder intérprete do divino ter desabrochado em primeiro lugar. Ao enfrentar as vicissitudes do imediato e do quotidiano era preciso uma reacção rápida numa situação de perigo. Essa referida situação exige um sentido de comportamento imediato ligado à sobrevivência e não um apelo a uma divindade. Defender-se, escapar-se, esconder-se, matar os animais, eis o que tinham de fazer em primeiro lugar. Apelar ao divino numa situação de perigo iminente era uma perda de tempo. A divindade é menos despachada, exige muita burocracia...
PACKETA
É uma indicação utilitária. Como justificas no teu pretenso sistema a presença de um Criador divino nos discursos do homem das civilizações ditas civilizadas?
MANDALA
Para quem nasça inserido e adepto da cultura judaico-cristã não é difícil crer que o homem foi feito à imagem e semelhança do Criador. Este homem crê que tem uma alma imortal. Quer depois de morto vá para junto do Ser Supremo, quer vá para o Diabo que o espere, a imortalidade é com ele. Se a alma é imortal logo é eterna. Deus é eterno. Precede o homem e criou-o. São ambos semelhantes porque eternos. Quem não alinha com um não-Criador não tem problemas. É menos um para chatear a cabeça do feiticeiro. Este adepto do não-Criador entende o líder político. Crer nele e vê-lo é uma prática. Próximo dele até pode cheirá-lo. Nos tempos de guerra é necessário um líder forte e o homem está quase sempre em guerra. Nos curtos períodos de paz a cabeça do feiticeiro é importante para liderar, melhor, co-liderar a permanência do Corpo Central no espaço que lhe cabe no planeta que habita.
PACKETA
Não só não respondeste à minha questão como não és capaz de explicar o aparecimento da Fé, no teu sistema, como manifestação dos fiéis.
VARETT
É sempre assim! Eu já estou escamado.
MANDALA
A questão é saber se as ideias que surgem com a vontade que se tem em acreditar em coisas não visíveis correspondem a factos que julgamos ter existência metafísica, convenhamos.
VARETT
O outro já dizia: a Fé te salvará.
Continua amanhã, dia 15 de Agosto de 2006

Sunday, August 13, 2006

 

CADERNO DO OLHAR II CONT. do dia 12/8/06


CADERNO DO OLHAR II

CONTINUAÇÃO DO DIA 12 DE AGOSTO DE 2006

KALIX
Penso que o que apareceu primeiro foram as formas orais que se ligavam às coisas úteis, logo formas de tratamento.
MANDALA
De sobrevivência?
KALIX
De sobrevivência!
MANDALA
Julgo poder afirmar que depois deve ter aparecido o verso e a quadra medicamentosa.
KALIX
E daí?
MANDALA
Parece, pois, que uma literatura surge às cavalitas noutra.
VARETT
Pergunta-lhe se o amor apareceu primeiro.
KALIX
Como?
VARETT
Eu penso que o amor apareceu primeiro do que a medicina. Se assim for, tu estás trocado.
MANDALA
O amor aproxima o quê?
VARETT
Os seres humanos feitos à imagem e semelhança do Criador.
MANDALA
E que parte desses seres é que o amor aproxima?
VARETT
O coração, a mente...
MANDALA
E depois?
KALIX
Crescem. Fazem literatura.
MANDALA
Multiplicam-se?
KALIX
Multiplicam-se, procriam. Qual é o problema?
MANDALA
Multiplicam-se com a mente, com o coração?
VARETT
Não lhe respondas!
MANDALA
Procriar é manter-se por cá o mais tempo possível?
KALIX
Sim. E depois?
MANDALA
Faz versos a isso meu caro que eu acompanho-te à viola!
VARETT
Qual será o problema em fazer versos ao coração e à mente apaixonados?
MANDALA
Nada! É que estou convencido que tanto a mente quanto o coração orientam a actividade e o funcionamento das cloacas e dos falos.
VARETT
Quantas vezes não é o amor a própria poesia? Porque deverá obedecer a disjuntores ou coisa parecida?
MANDALA
Os disjuntores acompanham o envelhecimento da mente e do coração...
KALIX
O amor nunca morre!
VARETT
Já foram vistas pessoas a acenderem-lhe velas.
MANDALA
E outras a lerem-lhe poesia à beira da sepultura.
KALIX
O amor renova-se e renasce geracionalmente. A poesia acompanha-o. Ela é imorredoira.
MANDALA
A duração da poesia é a duração do homem.
VARETT
Claro, senão não havia ninguém para lê-la e senti-la!
MANDALA
Não te preocupes. Não diz o Kalix que o amor não morre. Quando o homem desaparecer da face da Terra. Ele (o amor) passará a dar-lhe existência...
VARETT
Este passa o tempo todo a gozar connosco. A poesia é o pensamento em liberdade e nada tem a ver com a ditadura dos seus (teus) Corpos Centrais.
MANDALA
Tudo está condicionado. Até o Universo.
KALIX
O Universo é livre!
MANDALA
O Universo é o maior Corpo Central que existe!
VARETT e KALIX
Fujamos antes que ele diga que é um dos sensores do Universo.
MANDALA
Fujam por este lado que eu já vos apanho no outro.

CONTINUA AMANHÃ, DIA 14 de AGOSTO DE 2006

Saturday, August 12, 2006

 

CADERNOS DO OLHAR II


CADERNOS DO OLHAR II CONTINUAÇÃO DO DIA 11.8.06

KALIX
O amor sente-se, não se descreve. Claro que é difícil, senão impossível descrevê-lo sem relacioná-lo com objectos e factos.
MANDALA
Daqui a pouco vais dizer que o amor é um fogo que arde sem se ver, como dizia o outro.
KALIX
É qualquer coisa que tenho dificuldade em explicar.
MANDALA
Se o não podes explicar sem referências materiais, como podes criar um texto literário sobre o amor?
VARETT
Acho difícil...
KALIX
O amor é sublime! Lembrei-me agora.
MANDALA
Tu sabes muito bem que esse termo é relativo a objectos.
KALIX
Não só. Está relacionado com a ideia de beleza.
VARETT
Ora toma!
MANDALA
Diz-me onde encontras a beleza fora dos objectos?
KALIX
Na mente.
MANDALA
Quem ou o quê a levou para lá?
KALIX
Eu possuo a beleza. E tanto é assim que quando a identifico numa paisagem, por exemplo, ou num ser humano, sinto prazer.
MANDALA
E quando deparas com uma lixeira a céu aberto?
VARETT
Este tipo troca tudo!
KALIX
A lixeira cria-me repulsa, ao contrário de algo que possui beleza.
MANDALA
Tu reconheces a beleza quando a relacionas. Imagina que não a relacionavas com nenhum objecto ou facto. Para que te servia? Penso que aí dentro (aponta para a cachola de Kalix) sozinha não tem utilidade. Parece-me! E parece-me, também, não ser muito difícil aceitar que seja assim.
VARETT
É capaz de ser muita areia para a carreta dele.
MANDALA
Aquilo que sentes e não podes explicar não é mais do que um mau funcionamento do teu organismo.
KALIX
Ora bolas!
MANDALA
De bolas percebo eu!
KALIX
Meu Deus!
MANDALA
Explica-O sem a dimensão objectal.
KALIX
Ora bolas!
MANDALA
De bolas percebo eu! Espero que não voltemos a explicar essências sem o essencial.
VARETT
Este tipo vicia o diálogo e copia-o dos clássicos com um grande descaramento. Nunca concluímos seja o que for.
MANDALA
Como queiras! Já não é a primeira vez que me colocas no mesmo saco. Tudo foi discutido e explorado pelos clássicos. Quando a ciência avançou para esferas que lhes pertenceram e os reduziu à especulação e dedução, entrou-se no espaço do olhar , do ver quase a mexer. Toca, cheira e manipula é a regra hodierna. Pensamos, hoje, com novos olhos, novos dados e novas bíblias.
VARETT
Tu, também, especulas! Ora bolas!
MANDALA
Achas? (Ri-se perdidamente)
KALIX
A literatura é livre. No teu bicho não passa de um relato da matéria circundante. Um ou outro desvio e ficaste por aqui.
VARETT
Ir mais longe não será fazer literatura de literatura? Estarei a especular?
MANDALA
A literatura como produto de um órgão colaborador do Corpo Central serve como meio de sobrevivência.
KALIX
De sobrevivência?
MANDALA
Diz-me se a literatura médica está ou não ligada à sobrevivência?
KALIX
Sem dúvida! Duvido é que isso aconteça com a poesia, anseios de alma de poetas.
MANDALA
Estás, então, de acordo que existe uma literatura que leva à sobrevivência e outra que tu não aceitas como tal.
KALIX
Certo!
M
Quando os homens ainda não tinham descoberto a escrita e utilizavam a oralidade como meio cultural para transmitir conhecimentos e comunicarem entre si coisas importantes, achas que eles começaram primeiramente a dizer poesia? Não falariam de ervas milagrosas ou de outras formas para se tratarem em primeiro lugar?
VARETT
Toma cuidado, não vás na cantiga dele!

Continua amanhã, dia 13 de Agosto de 2006

Friday, August 11, 2006

 

NOVO CAPÍTULO


INÍCIO DA SEGUNDA PARTE

CADERNOS DO OLHAR II

PERSONAGENS
KALIX, VARETT E MANDALA

KALIX
(Para Mandala)
O Varett contou-me a tua última mandalice. Não me contive e procurei que ele me levasse até junto de ti. Cá estou! Vamos trocar impressões sobre o que me disse para esclarecer o assunto.
VARETT
Vais, vais!
MANDALA
Saudável amigo, apanhas-me de saída. No entanto, ainda disponho de alguns grãos de ampulheta para ti. Diz lá da tua justiça, perdão, do teu disjuntor.
VARETT
Este tipo é de morte!
KALIX
Muito do que disseste ao Varett não passa pela cabeça de ninguém. Deixemos parte do que deisseste para o julgamento de outros. Corpo Central, disjuntores, sensores, órgãos cooperativos, corporativos, indivíduos, sobrevivência, imperialismo, etc. Pretendo saber aonde queres chegar.
VARETT
Santa ingenuidade...
KALIX
Vamos supor que eu aceito como provável o teu dito “sistema”.
VARETT
Que ninguém entendeu até agora!
KALIX
Vamos dialogar dentro do espírito de tolerância. Vou, pois, introduzir as minhas questões. Parece-me, no entanto, que está explicito na tua exposição que ao criares um bicho social, este pouco difere de uma máquina. Carrega-se num botão e pronto, sai um comportamento tabelado. Entre a natureza e o Corpo Central existe uma cumplicidade material. Tu focalizas essa quetão.
MANDALA
Estamos entendidos. Vamos a isso!
KALIX
Como justificas o aparecimento da literatura e dos poetas nesse ser que pretendes ter criado?
MANDALA
No Corpo Central há lugar para todos. Essa é a sua condição fundamental. Coloquemos frente a frente dois tipos de órgãos. Por exemplo, criadores de gado e proprietários de restaurantes. Façamo-los dialogar no quadro da utilidade das suas áreas respectivas. Acredito que os criadores de gado perceberiam que necessitariam de intermediários a fim de colocarem os seus produtos nos pratos dos restaurantes. Da criação do gado ao prato encontraríamos distribuidores, veterinários, motoristas, gasolineiros, polícias, fiscais económicos, bancos, rede de frio, viaturas, cozinheiros, empregados de mesa, etc. Estaríamos aqui muito tempo se quiséssemos enumerar toda a complexa rede de actores e actividades para tornarmos completo o discurso entre ambos.
VARETT
Isso seria assim se eles fossem cultos!
MANDALA
Não trinques a língua!
KALIX
Eu falei em literatura!
MANDALA
os homens falam e escrevem de entre muitas outras coisas que fazem. Os animais falam mas não escrevem, por enquanto.
VARETT
Pode-se descrever parte de um circuito que vai desde o aparecimento da matéria-prima até ao produto final. Eis um pequeno exemplo: o transporte de queijo de vaca de uma fábrica para os supermercados é feito em camião frigorífico.
KALIX
E depois? E quanto à justificação para o aparecimento da literatura?
MANDALA
Pode-se referir o mesmo circuito utilizando uma outra “fala”. Pode-se recontá-la assim: meus queridos netinhos, o leitinho qua a vaquinha ruminante e sonolenta ofereceu ao tratador, não era adocicado mas estava muito quentinho. O bezerrinho adorável também queria mamar e ficou chateado com a mãe vaquinha por esta o dividir com outros parentes muito afastados. Um homem com a barba por fazer levou o leitinho num grande balde para a praia que estava num carroção muito branco e frio como as neves de Kalinin. Umas meninas, quanto os anjos brancos de colégio de freiras tendo à cabeça cambraia creme mexem no leite em toneis metalizados dentro de uma casa plena de janelas.
KALIX
Para onde vamos parar com esta conversa?
MANDALA
O texto literário é um texto subjectivo que dá origem a várias interpretações. Umas vezes, é rico em figuras de estilo. É poesia, é metáfora é palavra sem limite. Difere do texto científico que é rigoroso. A literatura (infantil) aqui referida é uma liberdade.
KALIX
Estás a entalar-te. Da dificuldade em explicares o que é que se entende por literatura, saltaste para a liberdade. O laço aperta-te cada vez mais.
MANDALA
Achas que poderia ter surgido a criação de um texto tão livre se não houvesse uma referência a factos reais?
KALIX
Hum!!!
MANDALA
Retira factos e objectos da nossa vida e elabora um texto livre. Será que consegues?
KALIX
Sobre o amor...
MANDALA
Continua, mas não fales em passarinhos, rios, luz do luar, primavera, rosas, azáleas, etc.

Continua amanhã, dia 12 de Agosto

Thursday, August 10, 2006

 

CADERNOS DO OLHAR I CONTINUAÇÃO DO DIA 9 DE AGOSTO DE 2006

VARETT
Lá estás tu!
MANDALA
No passado, mulher adúltera seria apedrejada até à morte. No passado recente, mulher que quisesse viajar teria de obter permissão do marido. Eu repito, o que é justo hoje, não o era no passado.
V
Sim, que chato!
M
A Justiça altera-se e modifica-se. Hoje, não podes beber mais do que três cervejas pois corres o risco de seres levado a tribunal se estiveres a conduzir com o efeito que elas fazem . No passado, quem bebesse trinta cervejas passava a ser uma espécie de herói engraçado (tipo Pedro, filho do conde Bezukov de Guerra e Paz, que mamou uma garrafa de vodka de um só gole) se conduzisse com tanto álcool e a fazer asneiras ao volante de um carro. O que era era giro ontem, é hoje um verdadeiro crime. A Moral e os Bons Costumes estão sempre ao sabor das novas culturas e estas são mais infiéis que as cabras do mato.
V
Ainda não falaste da falta de segurança.
M
A insegurança suscitou tanta apreensão quando começou a fazer parte do nosso dia a dia como quando a burguesia surgiu no seio da comunidade humana.
V
Agora é que vais ser internado!
M
A burguesia proveniente da troca e do armazenamento de bens, quando apareceu, parecia vir fazer perigar o Corpo Central, tal como o papel da insegurança nos nossos dias.
V
Explica-te melhor, por favor!
M
A burguesia explora os indivíduos ao ponto de estes se terem organizado em grupos de defesa com o fim de mudar o comportamento daquela para escaparem à sua voracidade. No desenvolvimento de alguns Corpos Centrais as relações entre explorados pela burguesia e esta foram tendendo a harmonizarem-se e deram origem a alguns compromissos. O Corpo Central fortificou-se após algumas vicissitudes. Com a insegurança passar-se-á o mesmo. A burguesia comercial, por exemplo, invade os televisores com publicidade a toda a hora. Nos mesmos televisores a violência também assenta arraiais. A violência apela a muito material, a muito desejo de compra. Mais tarde saberemos que tipo se acção será efectuada a fim de modificar comportamentos entre uma enorme quantidade de indivíduos propensos a criarem insegurança (desempregados, jovens desnorteados e à procura de objectivos, gente faminta, vendedores e consumidores de drogas, vítimas do fascismo, refugiados, etc.) e as chamadas Forças da Ordem. A estas os sensores preparam novos modelos de actuação. Se os Corpos Centrais dizimarem os fazedores de insegurança dizimar-se-ão a si mesmos. Aguardemos...
V
Estás a querer dizer que quando os Corpos Centrais se aperceberem que os grupos que com eles colaboram na sua sobrevivência e expansão estiverem em risco de desaparecerem que os criadores-agentes de insegurança poderão ser severamente punidos e até extintos?
M
Tudo vai depender de os os grupos criadores de insegurança se associarem ou não entre si. Penso muito na globalização da insegurança. Se o crime organizado “especial” continuar ligado ao sensor da política e ao sensor da religião e se ambos alargarem as suas influências e margens de lucro até aos “inseguradores”, o Corpo Central não tem outro remédio se não aceitar este novo modelo de cabeças desde que com isso garanta a sua sobrevivência. Esta está em primeiro lugar nem que para isso vá alimentar os parasitas associados que vão surgindo ao longo das épocas.
V
Repete lá isso que é para eu tomar nota. Ah! Ah!
M
Apenas acrescento isto: quando os sensores políticos e os sensores religiosos se distraem nas tarefas que o Corpo Central lhes incumbe e permitem que à sua volta a burguesia desequilibre e desajuste a riqueza criada não a distribuindo de molde a permitir que o bicho da batata sobreviva e se expanda conforme a sua natureza, é possível que o animal em causa mate, esfole e frite os ditos sensores e os substitua por outros. E pró-sensores não faltam pois estão inseridos na lógica do desenvolvimento, da expansão e como não podia deixar de ser da sobrevivência.

Continua amanhã, dia 11 de Agosto de 2006

Wednesday, August 09, 2006

 

CADERNOS DO OLHAR I

CONTINUAÇÃO DO DIA 8 DE
AGOSTO DE 2006

VARETT
Não dizes nada de novo. Estou de acordo, mas...
MANDALA
Não vês que afinal o espírito que preside à eliminação de seres por outros seres não é mau nem bom. É útil! Estão em causa outros valores. E são estes que permitem que tu e eu e outros que tais estejamos vivos e cheios de crimes na consciência. A partir do momento que te fizeram espermatozóide, tu pouca diferença fazes da cadela. Para viveres condenaste à morte os teus irmãos gémeos.
V
Mas eu, na altura, como espermatozóide não tinha consciência!
M
Ainda bem!
V
Porquê?
M
Porque aumentava o número de psiquiatras!!!
V
Conversar contigo dá nisso! Nesta conversa já falaste de Platão e de Justiça. Eu creio que não tens credenciais para tanto. Mas, vá lá! É o que temos mais à mão. Diz lá como é que havemos de lidar com a Justiça nessa tua macacada, perdão batatada?
M
Platão e a sua Justiça são muito velhinhos. Permanecer em Platão é como aquele que se nega a usar a algália tendo a bexiga cheia e dolorosa. A urina matá-la-á se não for expelida. E só a algália...
V
Meu Deus! Já chegamos aos mictórios! Esta conversa não passa disso.
M
Eu preciso de ti para conversarmos. E é esta a razão da tua existência. (Ri-se até às lágrimas como um perdido) ... Continuando no Corpo Central existem disjuntores em vez de Justiça ou coisa parecida...
V
Ai madrinha! Este gajo é anedótico. Que falta me faz o riso e és tu quem ri!
M
(Olhando para a barriga de Varett) Imagina tu que os vários órgãos que compõem o Corpo Central matavam e comiam todas as vacas existentes. Que sucederia? Não respondas, não tenho paciência para te ouvir gargalhar.
V
Tu és um ditador doméstico...
M
Responderás mais tarde. Está bem?
V
Que remédio!
M
Acabar-se-iam o leite e seus derivados. A indústria adjacente fechava as portas. Os distribuidores, os retalhistas e os armazenistas caminhariam para a falência. Os sectores primário, secundário e terciário ressentir-se-iam imenso. Não achas que alguma coisa estaria a correr muito mal? Não respondas caríssimo! Para que tal não acontecesse seria necessário que algo desligasse o sentido negativo desse comportamento e procurasse equilibrar de novo a produção. A Justiça é isso mesmo!
V
Bolas, isso é estatística ou coisa que o valha!
M
Quando se entrega aos mais fortes toda a espécie de poder, o que é que achas que acontece?
V
Posso responder?
M
Sim!
V
Abuso e destruição!
M
Por que razão é que param?
V
Porque não são estúpidos. Precisam dos fracos para estes os servirem.
M
Ao mesmo tempo que não destroem os fracos fazem-lhes ou não justiça?
V
Pode ser assim considerado.
M
Então, não ser estúpido é fazer justiça!
V
Lá vem este com o velho truque. Deixa-te disso!
M
Está bem. Vamos, então, raciocinar `micaelense porque é mais aconchegado às nossas mentes.
V
Vês como tu me percebes!
M
Há qualquer coisa que faz parar a “acção maldosa” dos constituintes do Corpo Central e evita a sua extinção. Aquando das conquistas, os senhores que se apropriavam das terras eram “obrigados” a deixar parte delas para outros. Não seria porque sem os que as cultivassem, o Corpo Central não poderia sobreviver nem expandir-se?
V
Daqui a instantes vais dizer que Justiça é igual a sobrevivência e expansão...
M
Dizes bem. Porém, exploremos um pouco mais a coisa para ficarmos esclarecidos o quanto baste. Quando falei nos órgãos do bicho da batata , referi, se estás lembrado, um padeiro, um soldado e mais adiante tu aduziste os juízes, os donos do dinheiro, etc.
V
Sim, e depois?
M
E quando falámos, também, do cérebro e da unha, não estávamos a pôr tudo no mesmo saco?
V
Estávamos a pôr tudo no mesmo bicho.
M
Distinguíamo-los ou não?
V
Pelo menos, fizeste a diferença que existe entre a unha do pé e o cérebro.
M
No Corpo Central, os órgãos estão escalonados para diferentes tarefa tendo em conta o objectivo comum e final. Há quem pense em hierarquias. Usemos o termo para melhor nos entendermos. Eu diria que em determinada altura do desenvolvimento económico dos Corpos Centrais, por exemplo, os donos do dinheiro, os militares de alta patente, os juízes, etc., teriam aquecimento no Inverno contrariamente ao que acontecia com os restantes indivíduos. Diria, também, que em determinada época, a grande massa de indivíduos não possuía casa nem viatura própria. Passados anos, a maioria possui carro e casa e aquecimento no Inverno. De acordo com a ideia de expansão (falo como ocidental), no tempo do frio “distribuído” a muitos, haveria ou não justiça na divisão de regalias?
V
Não havia justiça, não senhor!
M
Então, o que é justo hoje, era injusto ontem?

Continua amanhã, dia 10 de Agosto de 2006

Tuesday, August 08, 2006

 

CADERNOS DO OLHAR I - CONTINUAÇÂO DE 7/8/06


CADERNOS DO OLHAR I CONTINUAÇÃO DO DIA 7 DE AGOSTO DE 2006
MANDALA
Presta atenção! Quando o Corpo Central cria o sensor para a área religiosa, ele não incute nos indivíduos a perspectiva do viver mais além do que a vida física?
VARETT
Claro!
M
Não é isso uma forma de sobrevivência?
V
Isso é a apetência de eternidade. Isso é aspirar estar com o divino. É diferente do que se passa com os animais.
M
Tu conheces tão bem quanto eu que existem animais que se fazem confundir com a natureza para se tornarem predadores e outros que fazem o mesmo para fugir aos seus predadores. Se o fazem, não é para dançarem a valsa...
V
Para não morrerem.
M
Para sobreviverem, não será?
V
Pois seja!
M
Imagina-te um desses bichos. Achas que para eles é só uma questão de sobrevivência física? Não será que eles possuem uma ideia de viver mais? Mais “eternidade”?
V
Não, que disparate! Onde já se viu tal pensamento?
M
Perguntei por perguntar... É que não sei, de facto, se eles entenderão a eternidade. Sei tanto como tu que eles não gostam de morrer. Se não envelhecessem - de certo que - quereriam viver indefinidamente.
V
E não deve passar disso!
M
Entendes ou não que eles apesar de animais não gostam de morrer e que se fosse possível prefeririam passar muito mais tempo por cá?
V
Sim! E Deus, eternidade e coisas afins como surgem nessa tua batata que é bicho?
M
Tu, apesar de te saberes portador de uma licença para a eternidade, também por cá pretendes ficar o mais tempo possível.
V
Sim, e depois?
M
Por que será?
V
Não sei, só sei que quero.
M
Assim, como nada sabes acerca de Deus, pois nunca O viste , tu O desejas.
V
Claro!
M
Já são duas coisas de que nada sabes. Porém, admites que ambos – Deus e o teu desejo de perenidade – te empurram para a eternidade. Não será?
V
A minha eternidade e a dos outros seres humanos.
M
Eu olho para ti e vejo que tu na tua vida tens como objectivo viver. Embora não saibas bem porquê, a não ser por uma questão de continuidade, quer estejas bem ou mal. Com o bicho da batata passa-se o mesmo. Ele sente o mesmo!
V
Qual é a relação do bicho de batata com Deus?
M
A mesma que a tua. E di-lo através das suas cabeças e do seu comportamento.
V
Um amigo meu disse-me que o comportamento do homem singular é diferente dos animais. Estou de acordo. Eu vi uma ninhada de nove cachorros ser reduzida pela mãe a seis. Ela deixou morrer, propositadamente, três para que os restantes pudessem sobreviver e não desaparecessem todos. O homem não faz isso aos filhos!
M
Ela deixou-os morrer porque eles cometeram algum crime?
V
Não, que ideia!
M
E a cadela comete algum crime em querer salvar seis dos filhotes condenando os restantes à morte?
V
Claro que na sua natureza ela não é filicida. Essa não é a razão do seu proceder.
M
Os cachorritos escolhidos para morrer pela mãe não cometeram crimes de qualquer espécie. Certamente não seriam os mais aptos. Se o fossem ela não os deixaria morrer. Preferiu os mais fortes porque segundo dizem são estes que dão continuidade à espécie, nas melhores condições.
V
De acordo!
M
Com o bicho da batata acontece mais ou menos a mesma coisa. No começo da nossa conversa falámos de que se houver uma crise os sensores mandam matar aqueles que poderão fazer perigar o Corpo Central (acrescento em 8/8/2006: a guerra no Líbano e a morte de civis). A princípio foram as formigas a darem o exemplo de que nos servimos. Depois, aproximamo-nos do nosso semelhante e vimos que fazia o mesmo. Isto é, matava como forma, em última instância, para impedir a sua extinção. Recordas-te?
V
Estou lembrado. Porém, o homem tem critérios de escolha que os animais não demonstram.
M
Esses critérios apresentam ou não um objectivo comum com os animais que se designa por sobrevivência do grupo através da manutenção dos melhores e mais fortes desse mesmo grupo?

Continua amanhã, dia 9 de Agosto de 2006

Monday, August 07, 2006

 

CADERNOS DO OLHAR I - CONT. do dia 7


CADERNOS DO OLHAR I – CONTINUAÇÃO DO DIA 6 DE AGOSTO DE 2006

MANDALA
Umas vezes disfarçadamente, outras declaradamente. Porém, sempre dentro de uma lógica formalizadora muito forte. Ao ponto de se confundir com o sensor da política. Portugal, nos séculos XVI e XX, é um exemplo do que afirmei. Queres outros exemplos?, vira-te para a história que eu não sou nenhum compêndio.
VARETT
E as revoluções?
M
Não há aço! Olha bem a Revolução Francesa.
V

Liberdade, Fraternidade, Igualdade!
M
Lá isso gritaram os franceses em voz muito alta. No entanto, meia dúzia de anos após essa treta histórica, os mesmos que fizeram ecoar esses “palavrões” estavam de armas nas mãos a invadir tudo o que os rodeava de perto e de longe. As vítimas foram às dezenas. Portugal, Espanha, Itália, o Norte de África e muitos mais. Na Polónia, o esperma de Napoleão provou que à famosa trilogia revolucionária se devia acrescentar o uivo do macho vencedor com cio. Quando os conquistadores da liberdade deram por si, era demasiado tarde: mais de duzentos mil franceses foram para o galheiro com o rabo entre as pernas ao fugir de uma Moscovo vazia, fria e sangrenta que os puniu. Fraternidade, Igualdade e Liberdade tornaram-se gritos de imperialismos muito duvidosos. Napoleão não foi mais do que um sensor que interpretou “comme il faut” os desejos do seu Corpo Central.
V
Antes de acabarmos esta fase de conversação, diz-me que Corpos Centrais tiveram os melhores sensores?
M
Não te posso responder com rigor porque poderia vir a perder os meus direitos políticos.
V
O pensamento antigo que chegou até nós pela pena de Platão, a páginas tantas, refere e explica o aparecimento da Justiça e da Injustiça e de uma série infindável de conceitos. Dá-nos conta de que quando uma comunidade cresce e se constitui cidade é-lhe necessária a Justiça para melhor harmonia da Polis. Tu, na tua comunidade bicho da batata, em que lugar colocas a Justiça? Será no esfíncter da lagarta? (Ri-se)
M
Aprendeste, tal como eu, acerca das invenções psicanalíticas do Dr. Freud. Às tantas, ele apresenta o Id, o Ego e o Super Ego. Quase todo o mundo disse ámen. “Acharam graça”! Tratou-se do resultado de uma investigação. Ser ou não ser verdadeira pouco interessa (?)... O que valeu foi o salto que se deu na matéria. Ontem, estava eu a pensar como organizar este devaneio e lembrei-me de que a minha verdade apresentava três dimensões: a verdade achada, a verdade desencontrada e a verdade discutível. Ah! Ah! Ah1 Ah! A verdade achada é achatada! Ah!Ah!
V
Vai gozar com outro! Vamos jogar, a partir de agora, com as minhas regras. Eu é que questiono e vou utilizar o teu formato de pensar. Aqui vai! No teu bicho da batata, os sensores estão ligados ou desligados dos constituintes que são os indivíduos organizados ou não em grupo?
M
Estão ligados!
V
Como pode ser assim, se os sensores vivem à custa dos indivíduos, umas vezes mais incisivamente, outras nem tanto?
M
A opressão que pareces referir é mais uma orientação com vista à sobrevivência destes e do Corpo Central. Eu diria que eles estão ligados através do espectáculo. O espectáculo alivia o stress que surge sempre que o futuro se apresenta pouco risonho. Os imperadores romanos, por exemplo, eram useiros e vezeiros no fomento da diversão. Esta alivia e desmentaliza. Nos nossos dias, olha à tua volta... e vê como funciona com eficiência.
V
E os feiticeiros?
M
Também eles organizam os espectáculos. Qualquer dos sensores os tornam cadenciados, sistematizados e periódicos.
V
Está aqui estás a dizer que o futebol é a missa que os sensores da política oferecem ao Corpo Central...
M
Sim, mas mais divertida!
V
Para ti tudo é sobrevivência. É um tema mais do que estafado. O homem não é só sobrevivência. Há mais qualquer coisa. Não achas?
M
Tu a fazeres perguntas pareces uma alcoviteira. Retomo a técnica do velho maieuticista. O homem na luta pela vida não se torna imperialista, usando a minha terminologia?
V
Tem essa tendência. Todavia, não podemos esquecer o seu lado espiritual.
M
Parece-me ser correcto dizer que o bicho da batata luta pela sobrevivência. No que diz respeito à vida espiritual de que falas, eu penso que o objectivo é o mesmo.
V
Defender-se, atacar, comer e defecar tem o mesmo valor espiritual relativamente à sobrevivência? Não me digas!

Continua amanhã, dia 8 de Agosto de 2006

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