Wednesday, July 05, 2006

 

SOBRE MIM I


ESTE TEXTO FOI ESCRITO EM 2005, NO FIM DE UM PERÍODO DE AUTO-RECLUSÃO. E ELE NÃO PASSA DE UM ESCREVER POR ESCREVER. REPITO MUITAS VEZES IDEIAS TRABALHADAS (BARALHADAS?) QUE NÃO DERAM EM NADA. FICA A INTENÇÃO. MANDALA É UMA PERSONAGEM CRIADA MUITO TEMPO ANTES DE TER SIDO UTILIZADA COMO DESIGNAÇÃO DE UMA EMPRESA DE PUBLICIDADE PROPAGANDEADA PELA RTP. APESAR DE ESTAR REGISTADA NO JORNAL OFICIAL DA REGIÃO...

SOBRE MIM I

MANDALA
Permitam os deuses que o homem, que sobre tudo opina, se liberte da sua divina ajuda para poder explicar, ele mesmo, as confusões do Caos e do Cosmos que o envolvem, assim como outras coisas a que ainda não teve acesso e entendimento.

VARETT
Não me digas que os deuses falam pela boca dos homens e que estes por mais que estiquem a linguagem esta não passa de uma gravação da divindade?

M
Eu tenho a impressão que eles me fazem falar...

V
Não podes fugir a esta sina?

M
Creio que não! E é por isso que tento armadilhar a sua linguagem e a nossa também para me introduzir numa outra dimensão.

V
Mas a linguagem é sempre deles, mesmo armadilhada. É como uma programação.

M
Sim, é sempre deles, porém, eu vou tentar fazer com que eles se confrontem com ela para se ridicularizarem.

V
E se os irritas?

M
Isso é que era bom! Com eles descontrolados poder-se-iam destruir a si mesmos, dando origem a uma nova ordem.

V
Os deuses não se autofagiam. É por isso que são deuses.

M
Corta o cabelo e a barba ao deus-chefe. Veste-o com paletó, esgana-o com uma gravata às riscas e coloca-o numa bicha de espera num urinol público.

V
Parece um democrata!

(Continua daqui a pouco)
M
É isso! Vamos dialogar com ele. Vamos dramatizar. Fazes de conta que és o deus-chefe e vais entrar no diálogo como se fosses ele.
V
Isso não tem valor. Eu não sou o deus-chefe.
M
Se nós falamos a linguagem dos deuses, não vejo qual é problema?
V
Então, está bem. Eu falo por ele. O pior é se eu, aquilo que disser, nada tenha a ver com o pensamento dele.
M
Não te rales. Ninguém dá por isso. Passas despercebido. E ele nunca foi visto para poder haver comparações.
V
Eh pá! Olha que o Moisés além de ter falado com ele parece que o viu de lado.
M
Isso está escrito. Porém, o fundador do Judaísmo não o descreveu nem lhe tirou as medidas. Para além disso, esse deus tem uma geografia limitada e não joga bem da bola. Umas vezes diz que o homem deve crescer e multiplicar-se e de outras, como aconteceu ao Pai Adão, castiga-o por ele ter molhado a sopa na irmã, a dona Eva.
V
Irmã?
M
Eram filhos do mesmo pai!
V
Afinal, quem é ele? Será que vou dizer coisas que irá desdizer?
M
Deuses há muitos! Para este diálogo ir avante qualquer um serve.
V
És pagão? És ateu?
M
Nem pó! Eu não acredito em nada que os homens falam, inventam e fazem para serem tidos em conta.
V
Nem nas tuas palavras?
M
Tu és um finório! Por não acreditar no homem nem em mim é que procuro o que não procuro. Porque encontrar já encontrei.
V
Traduz o que dizes, diacho! Procuras o que não procuras e já encontraste o que encontraste...
M
Eu procuro o que não procuro por que essa procura começa e acaba em mim. Eu encontro-me na procura.
V
É possível encontrar a própria procura?
M
A procura - e o seu encontro - é tudo a que podemos aspirar. Aquilo que concebemos como morte é um dos momentos da procura. É um momento verdadeiro pois a partir dele já não podemos comunicar pelo menos no modelo tradicional. Procura é conhecimento, apetência e (des)apetência.
V
E ficas por aí?
M
Para já é o que tenho.
V
E a imaginação?
M
É o encontro com o desencontro. Embora ela possa, para muitos, ser um óptimo paliativo. Cada um faça o que quiser com a sua imaginação. Mesmo os que a não possuem à maneira, que sigam a imaginação daqueles que a desenvolvem indefinidamente.
V
Atenção, ainda estamos usando a linguagem dos deuses?
M
Sim, mesmo que não o queiramos pressupor para já.
V
O que fazemos não é nada de novo. Estamos interpretando o que nos rodeia. Não será? E ainda por cima auxiliados como não se pode deixar de verificar com as contradições do teu discurso.
M
É para ver se irrito os deuses... O que é preciso é avançar sem limites de incoerência contra os deuses. Esse é o meu encontro.
V
Onde colocas tu as descobertas científicas?
M
Não deixa de ser um encontro. Nós julgamos que a nossa razão e a nossa lógica nos pertencem. Outro descuido! Elas pertencem à natureza. Não fazemos cerimónia em roubá-las utilizando-as como se fôssemos os seus donos legítimos. Ingenuidade malandra.
V
Afinal, em que ficamos?
M
Tu queres é saber onde me coloco face ao encontrado. Atina! Nada posso procurar para além da própria procura. A procura não tem limites. A minha procura é a minha dimensão e o meu gozo. Se a minha natureza se diminui eu não dou conta disso, mesmo que me façam o favor de me prevenir. Diminuindo-me, diminuo os deuses que se julgam grandes. Se falo pela boca deles e me diminuo, eles é que pagam a factura. Engrandecendo-me, eles acompanham-me. Quando me torno num espinho , eles me odeiam. Quando sou doce, ei-los satisfeitos e agradecidos. Satisfeitos, prometem-me partilhar o seu céu. Nem que eu estivesse desejoso por estar na sua mofenta companhia.
V
Bem, vamos ao que interessa. Não tens mais nada que fazer a não ser jogares com as palavras e com as confusões que com elas fazes.
(Continua no dia 6 - quinta-feira)

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