Thursday, December 28, 2006

 

MEU DEUS PAI NATAL, EU VOS AMO

Segundo as últimas notícias, os ocidentais estão preparados para divinizarem oficialmente o Pai Natal. Roma estuda a possibilidade de beatificá-lo dentro dos próximos cinco anos. Não era compreensível que um ser que se dá com Deus há já tanto tempo não tenha um altar permanente. Aliás, milagres são-lhe atribuídos todos os anos. É ver como depois de ter descido por tanta chaminé, nunca ele se tenha sujado com a fuligem que costuma sair dos fornos que tratam da saúde dos perus e outras vítimas que odeiam a quadra que tanto agrada aos humanos. O Pai Natal faz-me lembrar as instituições de caridade. O que recebem em donativos é para distribuir não sem antes cobrarem uma certa parte. Esta ronda, por vezes os oitenta por cento da recolha. O Pai Natal está associado aos comerciantes. Estes à banca. Esta à indústria. E por aí fora. Emprego, mão-de-obra e competitividade são o fruto da acção do novo deus. Dêem-lhe um altar já, antes que alguma seita pegue na ideia e lhe dê forma física. O Pai Natal é a parte bem humorada da religião. Certamente, estará contra a interrupção voluntária da gravidez. Ficaria com pouco trabalho a realizar. Seria o descalabro económico de certas boas vontades. O Pai Natal é um santo deus verdadeiro. Não tira, não castiga. Só põe. Só dá alegria. É para compensar a vingança dos deuses que Roma inventou de tão maus que se tornaram. Matemos os velhos deuses que nos amarguram a existência! Deus morto! Deus posto! E que sorriso! E que santidade! Experimentasse o George Bush pedir-lhe para matar os inimigos como o fez ao Javé e havia de ver o Pai Natal dar-lhe uma vassourada. Eu creio no Pai Natal! Já não era sem tempo a minha conversão a uma querida e simpática divindade. O Pai Natal está mais rico e mais informatizado. É um deus do nosso tempo. Moderno e bem disposto. Vou já enviar-lhe uma SMS para que no próximo ano me traga uma sueca. Se possível novinha. Se as reservas já estiverem esgotadas, pode ser uma norueguesa. Escreverei um post scriptum a lembrar-lhe que estejam vivas não vá ele pensar que quero uma boneca insuflável…
manuelmbento
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Thursday, December 21, 2006

 

FRAGMENTOS
CAPÍTULO 2006 - III. a


Sabei que não sei.
Por isso questiono.
Se questionar é não saber!
Não saberei questionar.
Que questiono não sabendo, que não sabendo questiono?
Se não saber é fronteira de uma prisão sem muros, razões pergunto a quem lá dentro fica porque fica sem questionar.
Questiono? Eu Questiono!
Que raiz tem o saber que as palavras transportam?
Que levo nas palavras
que deixam de ser palavras
quando por elas questiono?
Com palavras saio e volto para dentro delas ficar.
Para que preciso das palavras se me confundo com elas?
Com elas me deito. Com elas acordo.
Sem palavras não me deito.
Sem palavras não acordo.
manuelmbento

Dezembro de 2006
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Friday, December 15, 2006

 

A Última Estação


O combóio não arranca se eu não descer.
No apeadeiro o chefe da estação aguarda.
Não pergunta pela bagagem porque sabe que dela não preciso.
Sabe coisas que eu não sei.
Devia saber?
Saio.
Nem combóio nem chefe se ficam.
Nem cão amigo me espera.
Não há luz, mas também não vejo escuridão.
O que será para trás do raio?
E da escuridão?
Estou descalço e sem roupas.
Oh, onde está o meu cabelo?
Pernas, braços, dentes, tudo se foi.
Parece que fiquei para trás indo em frente.
Se estou sem corpo, que corpo é este?
E é que fala, vê e sofre!
Tenho de voltar para trás, não me estou a sentir como de costume.
Para trás, mas para onde?
Fico onde?
Fico pouco tempo.
Fico o tempo que já não tenho.
Já não sei o que são as coisas que eram.
Já não sei o que sou não sendo.
Estão a desligar-me ?
Estão mesmo…
mmb
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Monday, December 11, 2006

 

UM LIVRO DA PRATELEIRA

Cristóvão de Aguiar serviu-se de uma personagem a que deu o nome de Severiana de Jesus para dar corpo a um dos mais criativos romances da literatura portuguesa actual: “Marilha”. Severiana lega-nos uma história político-religiosa de assombro, onde a ética que a enforma é uma opção de um humanismo vivido no plano do terreno de todas as vivências. Para avaliar Aguiar é preciso afastarmo-nos dele e da sua obra. Afastarmo-nos dos profetas imorredoiros da literatura universal também é preciso. Por exemplo, Dostoievsky escreveu “Os Irmãos Karamazov” num país com nove milhões de quilómetros quadrados de superfície e cento e tal milhões de habitantes à época. Quem é escritor sabe o valor que isso representa. Aguiar escreve “Marilha” num panorama único e restrito. Numa ilha com dezenas de milhar de habitantes e com setecentos e poucos quilómetros quadrados de superfície “descobrir” um discurso de gente de uma “Tronqueira” recheada de toda uma cultura de exploração psicológica “invisível” e não só ao nível de quem pouco sabendo sabe “tudo”, é ser-se senhor de uma pena genial, pois apresenta sentidos direccionais de conclusão ideológica jamais deslindados na escrita dos nossos actuais escritores, a não ser quando os propõem (os sentidos) como manifestos políticos. A participação de Aguiar na literatura universal desabrochou há muito. Mais do que nunca é preciso pensar Aguiar. A “literatura de veio açoriano” sofre de uma frente fria que a liofiliza. Talvez tenhamos medo de nos descobrirmos a nós próprios. Vai lá saber-se porquê...
manuelmbento
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Sunday, December 10, 2006

 

E MORRER, É PERGUNTAR O QUÊ E A QUEM?

Estou cada vez mais eu,
mais ciência quero dizer mais agrilhoado - mais imitação de (um) Universo.
Fechado?
Nem das janelas escancaradas me vem luz!
E para que a quero?
Luz sábia, luz divina?
Ora racionalidade para o divino que nasce e renasce
entre a seara do alimento como erva daninha!
Faço da cultura dos sábios uma refeição de morte.
Deito-me como me levanto. Nem o relógio, meu companheiro de quarto, distingue a vertical do desgaste. E, morrer é perguntar o quê e a quem? Morrer é um tempo que só se perde se for colectivamente absoluto. Colectivamente absoluto ... estou cada vez mais eu de uma consciência a prazo.
manuelmbento
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Sunday, December 03, 2006

 

XXXI

Conclusão

Emírcio, avisado por Inocência do que acontecera a Laura, corre para casa desvairado seguido pela criada. Em casa, Emírcio ajoelha junto à mulher. Apalpa-lhe a carótida e apercebe-se que Laura está morta. Agarra-se a ela a chorar. De repente, corre para o telefone a avisar o médico. Este quando chega apenas confirma o óbito. Laura vai a enterrar após as autoridades terem realizado a autópsia. Emírcio deu-lhes conta do sucedido. Laura fechara-se no seu quarto e por ter a mania das limpezas pusera-se a limpar os vidros das janelas. Quando saltara para cima do banco do toucador desequilibrara-se e desprotegida caíra na rua. Uma desgraça. Ninguém esperava tal desfecho. Tinha a vida pela frente. O seu enterro foi concorridíssimo. Laura tinha casado com total separação de bens. Porém, Emírcio conseguiu que ela depois da morte dos pais fizesse um testamento deixando-lhe tudo quanto herdara dos pais. Ele fizera-lhe o mesmo. Emírcio não possuía bens, apesar de ter conseguido pôr algum dinheiro de parte. Nos primeiros dias de nojo Emírcio recebeu muitas visitas que lhe iam apresentar condolências. Aos poucos recuperou o domínio da situação. Um dia apareceu a mulher do Carroça. Vinha à procura da filha a pedido do namorado. Inocência partiu para sempre. Emírcio nem se despediu dela. Aurora continuou a servir Emírcio. Não tinha outra saída. Seis meses depois, Emírcio casava com uma prima de Márcia mulher do senhor Souza. A sociedade micaelense abriu-lhe os salões. Emírcio arranjou primos e primas. É hoje, o que se pode chamar, um realizado. Um dia quando se dirigia ao Clube social pareceu-lhe ouvir uma voz a chamá-lo. “Olá primo!” Ainda se voltou para trás para corresponder ao cumprimento, mas não viu ninguém...
FIM
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