Saturday, August 12, 2006

 

CADERNOS DO OLHAR II


CADERNOS DO OLHAR II CONTINUAÇÃO DO DIA 11.8.06

KALIX
O amor sente-se, não se descreve. Claro que é difícil, senão impossível descrevê-lo sem relacioná-lo com objectos e factos.
MANDALA
Daqui a pouco vais dizer que o amor é um fogo que arde sem se ver, como dizia o outro.
KALIX
É qualquer coisa que tenho dificuldade em explicar.
MANDALA
Se o não podes explicar sem referências materiais, como podes criar um texto literário sobre o amor?
VARETT
Acho difícil...
KALIX
O amor é sublime! Lembrei-me agora.
MANDALA
Tu sabes muito bem que esse termo é relativo a objectos.
KALIX
Não só. Está relacionado com a ideia de beleza.
VARETT
Ora toma!
MANDALA
Diz-me onde encontras a beleza fora dos objectos?
KALIX
Na mente.
MANDALA
Quem ou o quê a levou para lá?
KALIX
Eu possuo a beleza. E tanto é assim que quando a identifico numa paisagem, por exemplo, ou num ser humano, sinto prazer.
MANDALA
E quando deparas com uma lixeira a céu aberto?
VARETT
Este tipo troca tudo!
KALIX
A lixeira cria-me repulsa, ao contrário de algo que possui beleza.
MANDALA
Tu reconheces a beleza quando a relacionas. Imagina que não a relacionavas com nenhum objecto ou facto. Para que te servia? Penso que aí dentro (aponta para a cachola de Kalix) sozinha não tem utilidade. Parece-me! E parece-me, também, não ser muito difícil aceitar que seja assim.
VARETT
É capaz de ser muita areia para a carreta dele.
MANDALA
Aquilo que sentes e não podes explicar não é mais do que um mau funcionamento do teu organismo.
KALIX
Ora bolas!
MANDALA
De bolas percebo eu!
KALIX
Meu Deus!
MANDALA
Explica-O sem a dimensão objectal.
KALIX
Ora bolas!
MANDALA
De bolas percebo eu! Espero que não voltemos a explicar essências sem o essencial.
VARETT
Este tipo vicia o diálogo e copia-o dos clássicos com um grande descaramento. Nunca concluímos seja o que for.
MANDALA
Como queiras! Já não é a primeira vez que me colocas no mesmo saco. Tudo foi discutido e explorado pelos clássicos. Quando a ciência avançou para esferas que lhes pertenceram e os reduziu à especulação e dedução, entrou-se no espaço do olhar , do ver quase a mexer. Toca, cheira e manipula é a regra hodierna. Pensamos, hoje, com novos olhos, novos dados e novas bíblias.
VARETT
Tu, também, especulas! Ora bolas!
MANDALA
Achas? (Ri-se perdidamente)
KALIX
A literatura é livre. No teu bicho não passa de um relato da matéria circundante. Um ou outro desvio e ficaste por aqui.
VARETT
Ir mais longe não será fazer literatura de literatura? Estarei a especular?
MANDALA
A literatura como produto de um órgão colaborador do Corpo Central serve como meio de sobrevivência.
KALIX
De sobrevivência?
MANDALA
Diz-me se a literatura médica está ou não ligada à sobrevivência?
KALIX
Sem dúvida! Duvido é que isso aconteça com a poesia, anseios de alma de poetas.
MANDALA
Estás, então, de acordo que existe uma literatura que leva à sobrevivência e outra que tu não aceitas como tal.
KALIX
Certo!
M
Quando os homens ainda não tinham descoberto a escrita e utilizavam a oralidade como meio cultural para transmitir conhecimentos e comunicarem entre si coisas importantes, achas que eles começaram primeiramente a dizer poesia? Não falariam de ervas milagrosas ou de outras formas para se tratarem em primeiro lugar?
VARETT
Toma cuidado, não vás na cantiga dele!

Continua amanhã, dia 13 de Agosto de 2006

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