Thursday, November 02, 2006

 

NA SERVIDÃO DO DESEJO
Continuação

INOCÊNCIA
Seja o que Deus quiser! Se é a sua vontade. E meu pai?
CAMPONESA
Fala-se à Tia Júlia para apalavrar o encontro com teu pai. O que virá segue a direito. Com os homens é mesmo assim. É preciso não esquecer que o americano tem pressa.
INOCÊNCIA
Pois Alevá!
CAMPONESA
Ele não te há-de querer a servir. Cedo, vais ter de deixar esta casa.
INOCÊNCIA
Seja tudo por amor de Deus! Havemos de melhorar a nossa vida.
CAMPONESA
Abençoada! Abençoada da minha alma.

XXII

Tarde fria e cinzenta. Chove. Emírcio, encostado à janela da saleta, olha as ruas vazias da cidade triste. Laura entra. Vem vestida de preto.
LAURA

Vou para casa da tia da Márcia. Espero lá por ti. Pus qualquer coisa na boca. Não te preocupes comigo. O jantar daqui a pouco é servido.
EMÍRCIO
Era uma morte esperada.
LAURA
A tia gostava muito dela. Deixou-lhe tudo. Aos outros sobrinhos, nada.
EMÍRCIO
A Márcia não a visitava muito.
LAURA
Não era interesseira.
EMÍRCIO
Já sabia do testamento. Vou mudar de roupa antes de me sentar à mesa.
LAURA
A gravata preta está na gaveta de cima da cómoda. Tira-a de lá. (Pausa) Esquecia-me de te dizer que vamos ficar outra vez sem criada de fora. Arranjou um calafona para casar.
EMÍRCIO
O que é que estás para aí a dizer?
LAURA
Hoje, de manhã, veio cá a casa a mãe da rapariga. Veio dar-lhe a novidade.
EMÍRCIO
(Disfarçando a irritação)
Esta gente inventa cada uma. Agora, até casam como os ricos, nunca se libertando da sua condição.
LAURA
Vou prevenir as criadas que jantas daqui a pouco.

(Laura sai. Emírcio senta-se no sofá e tapa a cara com as mãos.)
Continua

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