Sunday, September 30, 2007

 



A ALMA NACIONAL VIA TV

Nestes últimos tempos de reflexão e de acalmia (perturbados apenas pela publicação de um trecho meu pelo acutilante Nuno Barata (x) no “FÔGUETABRAZE”, o que fez subir pela primeira vez em flecha o gráfico de leitores) apercebi-me que a alma portuguesa, vulgo identidade, está difícil de encontrar. O Estado tem mecanismos próprios para, em certos dias do ano, apelar às massas o sentido de Nação. Havia o Dia de Camões, mais tarde acrescentaram-lhe das Comunidades. O Primeiro de Dezembro também dá um jeito. O “5 de Outubro” junta-se-lhes, apesar de trazer o cheiro a sangue fresco da República. Quem estava no poder mandava concentrar meia dúzia de paisanos no local eleito para festejar a alma nacional. O Estado pagava as despesas para que os seus representantes fossem admirados-adorados pela plebe ignara. Nesses dias de lembranças de glórias passadas o povo olha os seus chefes como a encarnação da História. Se não fosse isso, em quem descarregaria ele as suas aspirações e visadas? Os chefes sabem-no e aproveitam. Nos restantes dias do ano a Igreja Romana encarregava-se de juntar os representantes da Nação debaixo do pálio das festas de Cristo ou na esteira de Sua Mãe, o que permitia prolongar o espírito de identidade nacional. A Nossa Senhora de Fátima até é Padroeira de Portugal. O que, diga-se de passagem, dá cá um jeitão. Cada um se vira para chegar ao local onde a alma portuguesa em maior número se concentra e fica mais à mão. As cerimónias duram três dias. O povo é que paga tudo e ainda recheia as caixinhas das esmolas pagando todo o tipo de milagre tabelado. Político que se preze não descura tal oportunidade de manipulação. Algumas destas cenas foram sendo passadas para trás. O Partido Socialista começou por colocar a Igreja no centro das discussões quando um primeiro-ministro de uma república de esquerda tinha um padre-confessor para o ajudar nos negócios de Estado. O chefe do executivo era um tal piedoso Guterres e o sacerdote o senhor Melícias detentor de cargos oficiais. Uma espécie de Rasputine assexuado. Os negócios Estado-Igreja sofreram um grande empolgamento, então. Porém, durou pouco. Guterres abandona o poder dando lugar aos social-democratas. Estes deixaram que o economicismo rompesse as velhas e pesadas estruturas económicas de Portugal dando origem a uma nova viragem mais consentânea com as directivas europeias. Num golpe palaciano um tal Sampaio, beneficiando das regalias de chefe de Estado permitiu que o Partido Socialista ultrapassasse a direita pela direita. O poder caiu nas mãos dos socialistas, mas estes não jogam com valores tradicionais, como sejam Deus, Pátria e Família. Os socialistas olham para o país como se tratasse de uma grande superfície comercial. Estas sobrevivem na base de uma publicidade bastante competitiva. Assim, o executivo socialista apercebeu-se que já lá vai o tempo em que as pessoas paravam para aplaudir a deslocação de um governante fosse ele baixo ou alto. Mais, que está mais difícil deslocar os aldeãos para fazerem número nos actos oficiais que ninguém liga, devendo-se o facto de todos eles terem um aparelho de esgoto, perdão de televisão onde permanecem quietos e espectantes e à espera que a hora da janta chegue. Não se passa fome como antigamente, e as pensões batem à porta todos os meses no dia certo. A malta está numa boa. Aos poucos os portugueses foram-se transformando em consumidores. Sendo Portugal uma superfície comercial é lógico que assim seja. Mas, então, onde encontrar a alma nacional? É fácil responder. Na televisão, em Fátima, nos campos de futebol e no aeroporto de Lisboa. Como nem todos podem deslocar-se a Fátima, ao futebol e ao aeroporto, aquilo que mais perto está da alma portuguesa é a televisão. Portugal é televisão quando não se desloca para as compras de carro próprio/banca. Vejamos o que se passa com as televisões que em Portugal se transformam numa única televisão com variantes norte-amerianas. As estações privadas organizaram um protocolo com a televisão do Estado a fim de se comprometerem com emissões de propaganda nacional e apoio ao poder político. Em contrapartida obtém facilidades com a lei da concorrência, permanecendo o Estado de olhos fechados às irregularidades. Resulta daqui a divisão dos ganhos publicitários (a carteira de clientes não aumenta), e ninguém corre riscos de falência. A televisão do Estado é suportada pelo OGE, por isso mesmo pode apresentar passivos anuais assassinos. As televisões portuguesas já não competem entre si. Desavergonhadamente dividem os programas de maior audiência entre si de modo a que os paspalhões não percam pitada. Não respeitam horários de quem tem de ir trabalhar no dia seguinte. Também não é necessário, o mundo português é a têvê. A publicidade é quase obrigatória para o programa de maior audiência. Mudar de canal é apanhar publicidade na mesma. Assim, fica o telespectador agarrado à publicidade do programa que na altura “é o melhor”. Depois, o jogo é o mesmo. Se os programas são fracos encontramos certos indícios de concorrência, para disfarçar. E estamos nisso. Portugal não tem jornalistas, o que existe são comentadores. O país é pequeno para ter jornalistas. Claro que existem excepções que lá de vez em quando dão de si… com riscos para a sua própria integridade. As manifestações da alma nacional acabaram. As centrais sindicais são o que resta para levar a efeito gritos de alma. Mas, mesmo estas nada tem a ver com a alma nacional. E se Saramago tem razão…
mmb
(x) – Senti-me Alcibíades. O I ou o II, já nem sei.

Comments:
Alcibíades?
Se não é fogotabraze, é o raio dum corisco.
Ah....ah....
 
Post a Comment



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?