Friday, November 23, 2007

 



O VELHO MESTRE

Alceu Cabido Silva Carneiro entrou tarde para a vida política. Convidado pelo antigo Partido da Democracia Cristã dos Açores a concorrer como deputado regional, Alceu não só aceitou como assumiu a direcção da campanha. Certo dia, uma jornalista resolveu entrevistá-lo. – "Senhor Alceu, qual o seu programa e quais são as suas propostas?" – "É segredo!" – "Como assim?" –" Só depois de ser eleito é que desvendarei o meu plano." – "Mas isso não é normal!" - "Se a senhora é jornalista, eu sou o Papa!" Com Alceu, chorava-se até às lágrimas, tais eram as suas saídas. Era mestre do sexo oral. Dava lições sobre o tema a amigos idosos e cada lição era uma verdadeira peça de teatro. Aos mais novos chamava de estúpidos para baixo sempre que se pedia um desenvolvimento mais pormenorizado sobre as posições esquisitas com que recheava as suas sábias e "práticas" explicações. Alceu admirava os alemães da Segunda Guerra, Reagan e a Dama de Ferro inglesa, e um todo nada Cavaco Silva devido ao ser ar austero. Na sua campanha “ordenou” que se fizesse um poster onde ele se colocava entre Tatcher e Reagan. Teve honras de meia página no Diário de Notícias. Por debaixo da sua foto podia ler-se: “Alceu, o meu voto é teu!” O seu plano de desenvolvimento secreto estava todo virado para o turismo. “Começa-se pela ilha de Santa Maria – dizia ele - para se aproveitar o seu aeroporto internacional e é lá que se devem criar as estruturas: casino, cabaretes, casas de diversão sexuais nocturnas, enfim, tudo que possa atrair divisas. Claro, tudo controlado por uma polícia com plenos poderes…” Alceu, também, previa fuzilamentos para combater a corrupção. Esta acção era sempre ventilada no “comité cristão para a liberdade de consciência”, grupo muito restrito de iniciados. Alceu gozava com tudo e, como não podia deixar de ser, com a política, com os políticos e com os jornalistas. Um dia encomendou um pénis de borracha e a partir daí sempre que intervinha colocava-o em cima do balcão da sua tabacaria. Perguntei-lhe por que o fazia. Respondeu-me que era para não se esquecer do que tinha para dizer. A verdade é que o apanhei - numa tarde em que abrira o “estabelecimento” - a mostrá-lo a uma futura deputada do Partido Socialista, na altura jornalista da RTP. Estava a dar uma lição. Discretamente saí deixando-o a dissertar sobre aquilo que suspeitava ser uma ligação muito teórica com o passado. Alceu ia a caminho dos oitenta… Hoje, tinha pensado escrever sobre o modo como os políticos e os jornalistas tratam a realidade. Depois, lembrei-me do Alceu Carneiro e já não consegui fazê-lo. Fica a sua evocação para substituir um texto que iria futurizar aquilo que os políticos esperam dos jornalistas nos tempos mais próximos: fomentar a perseguição e prisão de elementos da extrema-direita portuguesa, não deixar o Procurador Geral da República em paz até ele cair da cadeira para não fazer mais estragos aos acomodados e desestabilizar, ainda mais, psicologicamente Scolari para correrem com ele. Todos eles vão morrer pela boca. O mesmo aconteceu ao conde Van Zeller: abriu a boca em nome da decência. Enfim, como dizia o Alceu aos discípulos: “Oral, oral, meus meninos, por detrás também se chega lá!” – “Lá onde, Alceu?” – “Estúpido!” Era quase sempre assim que ele fechava as suas prelecções.
mmb

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